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terça-feira, 20 de abril de 2021

O que é liberdade?

Você é livre?
O que é liberdade?

Quais correntes a gente precisa romper pra ser o que é?

Acredito que as mulheres da minha geração, quase todas, buscam afeto e aprovação por meio do “agradar”. E aí, a gente cresce meio confusa entre o que é nosso e o outro espera da gente.

Essa caixa, a do que outro espera da gente, é a minha grande prisão.

Um cárcere simples, frágil até, mas altamente eficaz. Isso porque as paredes não refletem luz. Dentro dele a gente não enxerga dentro. A gente só enxerga fora.

Fora tem um monte de expectativas, olhares julgadores, dedos apontados, réguas, medidores, avaliadores. São muitos. E a gente acredita que precisa ser aprovada em todos esses testes. Então, o nosso foco, dentro do cárcere, é descobrir o que e como fazer para caber nesse cenário. Para se encaix(ot)ar.

A gente passa muito tempo traçando essas estratégias e ignorando todos os sinais, dores, dissabores que indicam a insatisfação de dentro.

Com o passar do tempo (e alguma terapia) você percebe como se aprisionou. Como se apagou. Como negou a própria essência acreditando que o objetivo desse jogo chamado vida é ser aceita do lado de fora.

Maturidade, dizem.

Deve ser mesmo.

Mas, iluminar o lado de dentro assusta. Você enxerga MUITA coisa que ficou guardada e escondida por anos. Coisas lindas. E coisas assustadoras. Todas elas são suas.

“Ah! Melhor apagar a luz!”

É... é um caminho. Porque limpar vai dar trabalho mesmo.

E vai doer um bocado. Vai te obrigar a desagradar. Simplesmente porque é impossível servir a todos sem se mutilar. E, sejamos honestas, a gente não aguenta mais perder pedaços por aí.

Então, haverá choro e ranger de dentes. Mas, vai te libertar!

E o grande objetivo desse jogo chamado vida é isso!

Ser livre para ser o que é. 

quarta-feira, 14 de abril de 2021

"Dois estranhos"

 Sabe metáfora bem elaborada que te faz ficar pensando no filme por dias?

Adoro metáforas.

“Dois estranhos” é dolorido. Especialmente para a população preta – que saca na hora, se revolta na hora, se desespera junto e fica atônita quando o filme acaba.

Meia hora de soco no estômago.

E não é filme.
Não é ficção.
É o que rola mesmo. Todos os dias. Dia após dia.

Banalizaram a vida preta a tal ponto que, aqui no Brasil, as pessoas nem se chocam mais. Lamentam e seguem.

Estou falando do genocídio contra a população negra.
E o filme é sobre isso também.

A grande sacada do curta é mostrar como estamos presos num beco sem saída. O que fazer?

É essa a pergunta.

E não há resposta.

Aliás, tem sim: o rac1sm0 precisa ser encarado como um problema real a ser solucionado pela branquitude – as pessoas que o criaram.

Para nós, população negra, a meta é sobreviver. E afrontar enquanto estivermos vivos.

Porque, não interessa o que a gente faça, o fim da história já está escrito.

Mas, somos muitos! E cada dia mais conscientes da nossa realeza! Sempre haverá quem enfie o dedo na ferida.

“Dois estranhos” foi indicado ao Oscar 2021 na categoria de melhor curta-metragem. O melhor filme, dessa leva, que eu vi até agora.

Está na Netflix.
Não assista antes de dormir. Talvez você não durma. 

Telas

 

bom dia!
tela
café
whatsapp
tela tela tela

email
óleo essencial
café
tela e tela

pausa pro almoço
tela
café
whatsapp e tela

ah! água!
boa tarde
tela
relaxante muscular
mais óleo essencial
mais tela

mais café

“tenho que dar um jeito de correr”
tela
“tenho que dar um jeito nessa casa”
álcool 70
“tenho que parar de comer chocolate”
tela e café

e chocolate
boa noite
pra quem?
não tem ninguém
apenas tela

e álcool 70
vinho – na sexta
mingau – nas não-sextas
e tela

13 meses de telas
- 350 mil vidas brasileiras
não existe novo normal
existe um novo mundo
e ele já está girando

cheio de telas

**o mundo não espera ninguém. “e o futuro não é mais como era antigamente”. o que você vai fazer com o privilégio de estar vivo?

domingo, 4 de abril de 2021

"Uma noite em Miami"

Malcom X, Muhammad Ali, Sam Cook e Jim Brown juntos, em um quarto de hotel, no ano de 1964 – auge da luta pelos direitos civis nos EUA.

Essa é a premissa de “Uma noite em Miami”, que marca a estreia da atriz Regina King na direção. O roteiro é adaptado da peça de mesmo nome, já bastante premiada. A linguagem para o cinema é mais dinâmica, mas a gente sente a pegada teatral: boa parte do enredo em um único cenário, poucos personagens, pouquíssima distração. Os diálogos são o centro das atenções.

E olha... diálogos muito profundos. Especialmente para a população preta.

Quatro lendas afro-americanas, reunidas em um quarto de hotel barato, discutindo estratégias de luta contra o rac1sm0, no que era pra ser a comemoração por Muhammad Ali (que, aliás, ainda era Cassius Clay) ter se consagrado campeão dos pesos-pesados. O encontro ocorre logo após a luta vitoriosa, e no dia em que Ali decide anunciar sua conversão ao islamismo.

Apesar de fictício, o filme é baseado em fatos reais. Ali tinha Malcom X como mentor espiritual e amigo. A decisão de se tornar mulçumano foi de fato pensada em conjunto. Sam Cook, famoso cantor de soul, rico, e criticado por não usar sua arte para fortalecer a luta do movimento negro. E Jim Brown, atleta, recordista da NFL na temporada, mas às voltas com a transição de carreira – decide se tornar ator.

No filme, somos apresentados a história e à personalidade dos quatro bem no início, antes do encontro. Logo de cara percebemos como cada um deles lida com o rac1sm0 – e como ele está sempre presente, independentemente de quão bem-sucedido você seja.

A grande reflexão do filme, levantada por Malcom X, é a questão do posicionamento racial. É possível dissociar a luta da fama, em nome do bom trânsito e da boa convivência? Tornar-se famoso é uma forma de libertação? O que emancipa? Dinheiro? Poder?

É sobre isso. Tratado em conversas doloridas, muitas vezes nervosas e ânimos exaltados – afinal, a chaga é profunda.

O filme foi indicado ao Oscar 2021 na categoria de “melhor roteiro adaptado”. Está na Amazon Prime. Depois de assistir, recomendo que você pesquise um pouco sobre a vida de cada um dos quatro. É muito interessante.

sábado, 3 de abril de 2021

A mensagem do sifão

 O ralo da pia da cozinha dava sinais de “problemas” há algum tempo. A água da louça suja começou a descer leeeenta.

“Ai, só falta essa pia entupir!”

Passaram-se os dias, a água foi escorrendo “ok”... vida que segue.

Algumas semanas depois, travou. Dei uns murros no ralo, pra fazer uma pressão. Foi!

Dias depois, de novo.

“Vi na internet que bicabornato com água quente resolve”.

Resolveu!

Mais duas semanas fluindo até que... entupiu de novo!

“Poxa, como se a vida já não estivesse ‘complicada’ o suficiente, agora essa água nojenta parada aqui”.

Minha relação com a pia da cozinha estava dando sinais de “problemas” há alguns meses, mas eu só parei pra resolver hoje, quando o sifão explodiu e interditou tudo.

Ao adiar a solução, eu achava que estava ganhando tempo. Resolvendo outras tretas mais urgentes. Ou, cansada demais pra pensar naquilo.

Enquanto estava dando para lavar a louça, fui tocando.

Mas, ficou insustentável. O sifão não aguentou tanta sujeira. Além de trocá-lo eu tive de limpar o armário alagado e jogar meio saco de açúcar fora.

Isso tudo por volta das 21h, quando eu olhei pra pia cheia da louça do almoço, que eu, deliberadamente, decidi ignorar porque estava cansada demais.

Eu levantei do sofá, olhei pra pia e conclui: ignorar o problema não faz com que ele desapareça. A louça continua ali. Cedo ou tarde vou ter que encará-la.

E assim fiz.

Quando enxaguei o último copo, o sifão pensou: “ótimo, agora olha pra mim aqui, você também não pode mais me ignorar”. E explodiu.

A vida é isso. Você pode encarar de frente e resolver logo os problemas. Ou ir adiando, juntar três semanas de roupa suja, acumular panelas na pia, fingir não ver o pó na estante... e ir tocando.

Mas, nada disso some. Está tudo lá, esperando você unir forças, criar coragem e limpar tudo de uma vez.

O momento? Cada um tem o seu.
Até que não tem mais.
Até que entope, azeda, mofa e você já não é mais livre pra decidir. Ou desiste e joga fora, ou encara o trabalho dobrado pra limpar – com o risco de nem ficar 100%,  uma mancha ali, uma mal cheiro impregnado acolá...

Como vocês perceberam pelo sifão, eu me dei conta disso na marra.

Mas, aprendi a trocar sifão!

Agora, vamos desentupir as tretas da vida.