Tem alguém aí totalmente satisfeito com a vida que leva? É
possível isso? Ou estamos todos condenados à inquietude eterna?
É como se a escada nunca tivesse fim. Você sobe, sobe, sobe
e o que te motiva é olhar pra cima e ver que lá do alto do prédio a vista deve
ser linda. Aí você continua subindo e quando chega, aprecia a vista por um minuto, agradecida pela oportunidade e pensando que todos os degraus valeram a
pena.
Até que você olha em volta e percebe um prédio mais alto
ainda, de onde a vista deve ser muito mais abrangente, panorâmica. “É pra lá
que eu quero ir”.
E começa a subir mais e mais degraus.
Sempre haverá um prédio maior? O nosso prédio nunca será da
altura suficiente?
Essa possibilidade me assusta. Porque, pensando assim,
passaremos a vida subindo escadas e nunca teremos tempo de sentar no terraço
com uma taça de Lambrusco, admirar a vista, sentir a brisa no rosto e recuperar
o fôlego da subida. Nesse raciocínio, a gente pára (com acento porque eu me
recuso a abandoná-lo e as novas regras ortográficas nem estão valendo ainda)
somente quando o coração der um siricutico no milionésimo degrau.
E aí? A subida foi pelo menos divertida? Ou a preocupação em
chegar era tão grande que a gente nem observou as obras de arte que
enfeitavam os corredores?
Além disso, há algum problema com os prédios normais?
Aqueles que não são um arranha-céu, são apenas edifícios. Cumprem sua função, são
honestos e limpinhos, no padrão. Não se destacam, é verdade, mas compõem o
cenário da cidade.
Ninguém quer tirar fotos em frente à fachada dos prédios
normais. Mas, eles continuam ali, sendo úteis pra muita gente. E a vista do
terraço também é bonita. Por que não se contentar com ele?
Porque contentamento é quase sinônimo de preguiça. De
derrota.
É?
É?
Contentamento descontente, diria Camões.
De onde vem toda essa pressão, Camões? É proibido contentar-se
de contente?
Talvez seja o momento de sentar no degrau onde estiver, dar
uma olhada em volta e pensar se continuar subindo é uma vontade ou uma imposição.
Se o desejo não é, na verdade, descer e brincar no térreo, onde não há nenhum
risco de cair – ou onde a queda é menor.
Às vezes é preciso mais coragem pra descer que pra subir,
mesmo com a força da gravidade a seu favor.
Agora, se a vontade for subir, tem que ir! Nem que seja pela
escada de incêndio. O que não pode é passar a vida esperando o elevador. Eles demoram
a chegar e não cabe todo mundo lá dentro. Somente alguns alcançam o topo do
edifício sem o esforço dos degraus.
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