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quinta-feira, 9 de dezembro de 2021

cortei

condição do indivíduo livre


autonomia para expressar-se conforme sua vontade

extinção de todo elemento opressor que seja ilegítimo

li•ber•da•de

ultimamente tenho pensado muito sobre o que é ser livre

o dicionário traz um monte de significados

kant também tem uma definição bem boa: a escolha de si próprio

quantas vezes você escolheu você?
em detrimento de julgamentos, padrões e expectativas. quantas?

numa conversa recente com uma pessoa inspiradora, ouvi que o que ficou conhecido como empoderamento é na verdade cansaço

e não é que é?

a gente fica exausta de carregar tanta coisa que não é nossa que vai se livrando pelo caminho

se libertando

deixando pra trás o que pesa e não agrega

lendo assim parece simples, né?!
mas, esse caminho não é nada tranquilo
é bem caótico na verdade

é que para se livrar das correntes você primeiro tem que enxergá-las - e a cena não é bonita não
dá um puta trabalho abrir cadeados, arrombar umas portas, fechar outras

não sobra tempo nem pra lavar o cabelo

cortei ✂️

pra MM ler

 eu queria que a vida fosse isso

ou, pelo menos, que tivesse mais disso
trilhas, parques, ar puro, sol e sorrisos
paz de espírito

mas, nosso caos diário é outro disso
é mais de aperto
no tempo, nas contas, no peito
uma corrida imaginária sem chegada

dar conta de si já é bem muito
o meu "si" tá foda
e o meu "si" mãe eu nem conheço direito
algumas faces que já vi não curti
e faz como?

você tá aqui - conhecendo essa maluca junto comigo
observando tudo
formando o seu eu
ensinando, aprendendo, ensinando

"que essa maluca não te enlouqueça"
é o que eu peço

não sei bem pra quem
porque isso de mãe é meio solitário também
peço pra mim mesma
na busca por alguma lucidez

na busca

sempre buscando, nessa corrida imaginária sem chegada

não acho bom te afetar com essa pressa
mas a vida parece que não espera
ou isso ou minha percepção afetada
que nos afeta

e você meio que não tem escolha
bom, não agora
dizem que antes teve
que me usar de portal para esse mundo foi optativo
se foi, que honra! te agradeço
mas, você leu as letras miúdas?

daqui a uns anos você volta a ter opção
vai escolher seus caminhos, suas pressas, seus afetamentos
que, tomara, sejam leves e
pouco afetados pelos meus (ó eu pedindo de novo)

(isso de mãe é muito de pedir também
de implorar, na verdade)

espero também que você lembre das trilhas, parques, dias ensolarados e sorrisos
vai desculpando as tempestades, apertamentos, afetamentos
e conte comigo pra qualquer arrependimento
ou ajuda pra pagar a terapia

e não esquece: tenho muito de louca
e o mesmo tanto dobrado de amor

minimalismo emocional

sempre que vai chegando o fim do ano sinto vontade de fazer um escrito com o balanço do que rolou. acho que todo mundo é assim, né?! essa coisa dos ciclos, aqui no ocidente guiados pelo calendário gregoriano, influencia a gente. isso e a fatídica pergunta do "então é natal e o que você fez?".


o que você fez?
o que eu fiz?
o que fizeram da gente?

sim, precisamos nos responsabilizar, mas sem ignorar que o sistema também moeu a nossa mente.

((o brasil me obriga a beber. algumas pessoas também, mas dessas eu simplesmente desisti.))

eu desisti de algumas coisas e pessoas.

o segundo ano de pandemia meio que decantou as coisas, né?!

"então, isso daqui não muda mesmo não - ou encara ou larga de mão"

larguei de mão.

mas, não é tarefa fácil. o tal do "deixar ir" não é simples.
desistir é frustrante. tanto quanto não conseguir. e, geralmente, um vem depois do outro. pelo menos por aqui.

desistir vem depois de perder bastante energia tentando. batendo cabeça. mudando estratégias. e entendendo que não, não depende de você.

larga de mão.

então, este fim de ano está mais ou menos nessa energia. estou chamando de minimalismo emocional: por menos encheção de saco.

um processo de desligamento de pessoas e de situações que não agregam e não condizem mais com esse novo momento.

sim, é um novo momento. quem está minimamente consciente já percebeu.

essa ótica individualista, da meritocracia, que nega fatos e dados científicos não se sustenta. é o fim em si mesma.

então, deixa findar.
larga de mão.
e bora pro próximo round, que a luta tá longe de acabar.

e vocês? tão animadas por aí?

quinta-feira, 29 de julho de 2021

Esse é pra você

 Esse vai para você que, há algum tempo, vem dizendo:

tá foda!

Para você que está exausta
sozinha
sobrecarregada

Pra você que, além da jornada de trabalho,
tem o cesto de roupa suja lotado,
a panela de molho te encarando na pia
e a culpa martelando por não dar mais atenção à cria

Pra você que lida com a inflação,
com o preço do bujão,
os boletos que não param de chegar
e a dor na lombar

Esse vai pra você que, de manhã, se pergunta se vai conseguir
e no fim do dia, se pergunta como conseguiu
Num ciclo infinito
que um dia se revela
no vinco da marca de expressão estampada na testa

Esse vai para você que queria ser vista
Queria uma mão estendida
Ou pelo menos alguém para cuidar da comida

Parece que ninguém vê
Que ninguém entende
Que ninguém se importa

Então,
não mesmo.

Esse é pra você,
pra te dizer que não podemos mais esperar alguém se importar

Ninguém está vindo
Salve a si mesma!

Olhe pro espelho,
para além da marca de expressão da testa
Tá foda! Tá muito foda!
E você está viva!
Só você sabe o trabalho da porra que dá se manter viva
Fazendo tudo isso aí
Que ninguém vê, mas que movimenta o mundo

O seu mundo
O da sua cria
O dos seus sonhos

Isso é gigante!
Parabéns!

E que você encontre uma forma de se reverenciar
De não se abandonar
Já basta o mundo lá fora


Cuide-se do jeito que você merece

E no fim do dia,
chorando no chuveiro,
pensando no que vai ser do seu cabelo
e das contas pra pagar
Lembre-se pelo menos de se abraçar.

Foi foda, mas vencemos mais um!

sábado, 17 de julho de 2021

Poder cinético do som

 Um mês sem passar por aqui. Não por falta de assunto.

A vida nunca esteve tão cheia. Ou a percepção da vida nunca foi tão acurada. Ou as duas coisas.

Quando é difícil organizar as ideias na cabeça, eu geralmente recorro às palavras no papel. Ultimamente tenho recorrido ao vinho. E ao leite condensado. A minha gastrite vive me criticando mas é o que está dando pra fazer, por ora.

Estamos há 16 meses testando estratégias. Novas formas de viver. Ansiando por vacina, tendo ânsia ao ler notícia, oscilando entre o desespero e a esperança. Normal dar uma sucumbida quando o pêndulo passa naquele vale entre um extremo e outro.

Às vezes, fica aquele ‘pra lá e pra cá’ lá embaixo. “Será que vai parar?”

Não entendo muito (na verdade, quase nada) de Física, mas parece que a conservação da energia mecânica é o que garante a constância do pêndulo.


Por aqui, eu simplifico em música.

Sabe aquelas que te remetem imediatamente a um lugar especial, uma ocasião marcante ou uma época boa?

A música é a responsável pela conservação do movimento e da energia do pêndulo de Newton aqui da minha vida.

O poder cinético do som.

Por exemplo, no exato momento em que escrevo essa frase ouço “Cheio de Manias”, do Raça Negra. E isso desperta em mim inúmeras boas lembranças que derramam no cérebro a serotonina necessária para sensação de bem-estar.

Tem Caetano, Red Hot, Backstreet Boys e Paralamas nessa playlist. Tem Alicia Keys, The Weeknd, Art Popular e Tim Maia. Tem Cartola, Vanessa da Mata, Beatles e, mais recentemente, uma musiquinha instrumental de ninar que me remete imediatamente a MM nos primeiros meses de vida e me faz chorar instantaneamente. Chorar de emoção boa!

E já tem até música que eu ouço agora e sei que lá na frente vai me remeter a essa época louca que, apesar de louca, vai despertar algo bom.

Nas minhas estratégias para seguir tem vinho, tem leite condensado e tem muita música.

(e café)

É isso que mantém meu pêndulo em movimento por aqui.

E por aí? O que impulsiona o seu?

segunda-feira, 14 de junho de 2021

A força do ódio

Sim, eu acredito no amor.

E aqui não estou falando dessa ideia romântica de amor, construída pela sociedade Ocidental colonizadora – que sempre vincula esse sentimento à renúncia ou sofrimento, por sinal.


Estou falando de amor como força motriz. O amor per se. Que nos impele a proteger e cuidar do objeto amado. Inclusive de nós mesmas.

Mas, hoje eu quero falar da força do ódio.
Sim, quero legitimar o ódio.
A ira.
A revolta.

Todo mundo sente, não me venha com chorumelas.
O ódio faz parte da gente assim como o amor. E a tristeza. E a alegria. E a frustração. E a raiva. E a preguiça.
São todos sentimentos humanos.

Foi essa mesma sociedade Ocidental colonizadora (interessada em dividir para conquistar) que inventou que ódio é ruim e feio e que você não presta se sentir ódio.

Daí veio o tempero da religião dizendo que ira é pecado capital, e você vai pro inferno se sentir revolta e vontade de mudar toda essa merda que está aí.

“Não é merda não”, dizem. “Nem use essa palavra! É feio! Seu sofrimento é redenção. Ignore essa ira e aceite o seu destino.”

Conquistar.
Colonizar.
Manter você no mesmo lugar.

O ódio movimenta. A ira quebra vidraças. A revolta nos impele a planejar para transformar.

Pois eu, admito, estou sobrevivendo pela força do ódio.

Sou contra armas.
E violência.
O que não quer dizer que eu seja contra o ódio.

O ódio, se canalizado pro lugar certo, é de muito bom proveito.

Por isso, estou aqui usando todo meu autocontrole para pegar essa ira + revolta + ódio e usar como combustível pra transformar a realidade – já que ela não tem sido favorável nem pra mim nem para gente como eu. O Estado continua matando mulheres como eu. Só pra citar um motivo.

Racionalize o ódio. Te ensinaram a racionalizar o amor – mas o amor é só sentir. O ódio é que precisa passar pelo crivo da mente, pra ser estratégico - e não virar ódio cego e irracional.  

Vivendo no Brasil, motivos sentir ódio e que não falta.

Aceite o seu. E vá fazer alguma coisa pra mudar toda essa merda que está aí.

PS: Para reclamações procure Mercúrio retrógrado. Grata.

sexta-feira, 4 de junho de 2021

Reavaliando o nível de aceitável

 Eu estava fazendo umas contas, e apesar de ser péssima em matemática, consegui equacionar o x e descobri que tenho acumulado CINCO jornadas nessa minha vida pandêmica.

Entre o trabalho formal, o projeto pessoal, a faculdade, os cuidados com MM e as tarefas domésticas, venho equilibrando esses pratinhos, tentando manter o nível do aceitável em todos esses papéis. Veja bem, o MEU nível de aceitável. Não o que a sociedade espera.

O meu nível de aceitável permite pular a faxina da semana e passar uma vassourinha bem rápida só pra recolher os cabelos. Permite também que eu me recuse a apresentar um seminário em grupo, por meio de videoconferência, pra aula de ‘Brasil 3’– faço as duas provas do semestre e torço por um MM (não o meu, o da menção). Enfim, passei com a média. Que é o meu aceitável pro momento.

Às vezes me pergunto se não deveria estar brincando mais com MM (o meu, dessa vez). Mas, o meu aceitável me libera dessa culpa - me dedico bem muito no momento do banho, do colorir e do dengo pra dormir. O brincar extenuante fica pro dia do papai. E assim seguimos.

A quantidade de xícaras de café permitidas por dia também passou por reavaliação. Liberei geral! Assim como as taças (garrafas?) de vinho aos fins de semana. E o chocolate depois do almoço.

São aliados para enfrentar tudo isso. Junto com as minhas músicas preferidas. E a vela que semanalmente deixo queimar para espantar, pelo menos do meu lar, toda essa energia pesada que paira no ar.

O ritual matinal mudou – mas segue existindo. Um “muito obrigada” para galera que me acompanha e me guarda, um abraço em mim mesma pra lembrar que existe amor, e água morna com limão. Bora!

A gente precisa de estratégia pra sobreviver. Uns mais que outros. Afinal, o tsunami taí, mas tem gente de iate enquanto alguns vão de bote. Então, elabore a sua e seja fiel a ela. 

Esqueça a régua dos outros. Elas não servem nem para esses outros.

Estabelece aí seu nível de aceitável e faça o que for possível. Já te demais pro momento.

No mais, café, chocolate, vinho e VACINA!

domingo, 23 de maio de 2021

O mundo novo

 


Uma foto de óculos escuros dentro de casa quer dizer muita coisa.

Uma delas é que a noite não foi fácil. Aliás, os dias não tem sido fáceis. Os meses. Bom, o último ano foi bem complicado.

Mas, quando há o desague numa madruga, a gente acorda meio de ressaca. Dor de cabeça, olho inchado. Horrorosa.

Culpada.
Com medo.
Se sentindo abandonada.
Cansada de estar em estado de alerta constante por, sei lá, 14 meses.
Com raiva.

Eu acho que, em outra vida, eu morri numa guerra. Como civil, não na linha de frente. Já sonhei com bomba caindo na minha casa. E a explosão de fogos de artifício são gatilhos.

Já imaginou?

Você no conforto da sua casa, na mesa de jantar, pensando nos problemas cotidianos enquanto ouve uma música e... BOOM! Tudo pelos ares! Não dá tempo nem de entender o que está acontecendo.

Eu sempre fico pensando nessas coisas. E as notícias da guerra entre judeus e palestinos também contribuíram pra reflexões recentes...

Essa pandemia gerou o mesmo estrago de uma guerra, mas com impactos homeopáticos distribuídos ao longo de 14 meses – e contando.

Os prédios estão de pé, a estrutura das cidades continua a mesma, não tem escombros físicos nem concreto nas ruas...

Mas, o mundo todo foi destruído. Vamos ter que reconstruir do zero. Não existe isso de “novo normal”. Não tem nada de normal.

É o novo. Ponto final.

O que nos gera sofrimento é usar o antigo como referência. Porque não, não voltar a ser como antes. Nada é como antes depois de uma guerra.

Tem traumas.
Tem saudade.
Tem ausência.

Tem também progresso.
Aprendizado.
Crescimento.

Não sem dor, óbvio.
Não tem com passar por uma guerra sem sentir dor.

Essa madruga eu me entreguei a essa dor. Mas, sei que não posso ficar muito tempo largada nela.

Porque os sobreviventes é que reconstroem o mundo.

Que tipo de mundo você quer construir?

PS: mesmo com a cara de baiacu que eu acordei, MM olhou pra mim, passou a mão no meu cabelo e disse: “bonita do Mulilo!”
É por ele que pego o restinho de forças, levanto, e vou tentar construir um mundo descente!

terça-feira, 20 de abril de 2021

O que é liberdade?

Você é livre?
O que é liberdade?

Quais correntes a gente precisa romper pra ser o que é?

Acredito que as mulheres da minha geração, quase todas, buscam afeto e aprovação por meio do “agradar”. E aí, a gente cresce meio confusa entre o que é nosso e o outro espera da gente.

Essa caixa, a do que outro espera da gente, é a minha grande prisão.

Um cárcere simples, frágil até, mas altamente eficaz. Isso porque as paredes não refletem luz. Dentro dele a gente não enxerga dentro. A gente só enxerga fora.

Fora tem um monte de expectativas, olhares julgadores, dedos apontados, réguas, medidores, avaliadores. São muitos. E a gente acredita que precisa ser aprovada em todos esses testes. Então, o nosso foco, dentro do cárcere, é descobrir o que e como fazer para caber nesse cenário. Para se encaix(ot)ar.

A gente passa muito tempo traçando essas estratégias e ignorando todos os sinais, dores, dissabores que indicam a insatisfação de dentro.

Com o passar do tempo (e alguma terapia) você percebe como se aprisionou. Como se apagou. Como negou a própria essência acreditando que o objetivo desse jogo chamado vida é ser aceita do lado de fora.

Maturidade, dizem.

Deve ser mesmo.

Mas, iluminar o lado de dentro assusta. Você enxerga MUITA coisa que ficou guardada e escondida por anos. Coisas lindas. E coisas assustadoras. Todas elas são suas.

“Ah! Melhor apagar a luz!”

É... é um caminho. Porque limpar vai dar trabalho mesmo.

E vai doer um bocado. Vai te obrigar a desagradar. Simplesmente porque é impossível servir a todos sem se mutilar. E, sejamos honestas, a gente não aguenta mais perder pedaços por aí.

Então, haverá choro e ranger de dentes. Mas, vai te libertar!

E o grande objetivo desse jogo chamado vida é isso!

Ser livre para ser o que é. 

quarta-feira, 14 de abril de 2021

"Dois estranhos"

 Sabe metáfora bem elaborada que te faz ficar pensando no filme por dias?

Adoro metáforas.

“Dois estranhos” é dolorido. Especialmente para a população preta – que saca na hora, se revolta na hora, se desespera junto e fica atônita quando o filme acaba.

Meia hora de soco no estômago.

E não é filme.
Não é ficção.
É o que rola mesmo. Todos os dias. Dia após dia.

Banalizaram a vida preta a tal ponto que, aqui no Brasil, as pessoas nem se chocam mais. Lamentam e seguem.

Estou falando do genocídio contra a população negra.
E o filme é sobre isso também.

A grande sacada do curta é mostrar como estamos presos num beco sem saída. O que fazer?

É essa a pergunta.

E não há resposta.

Aliás, tem sim: o rac1sm0 precisa ser encarado como um problema real a ser solucionado pela branquitude – as pessoas que o criaram.

Para nós, população negra, a meta é sobreviver. E afrontar enquanto estivermos vivos.

Porque, não interessa o que a gente faça, o fim da história já está escrito.

Mas, somos muitos! E cada dia mais conscientes da nossa realeza! Sempre haverá quem enfie o dedo na ferida.

“Dois estranhos” foi indicado ao Oscar 2021 na categoria de melhor curta-metragem. O melhor filme, dessa leva, que eu vi até agora.

Está na Netflix.
Não assista antes de dormir. Talvez você não durma. 

Telas

 

bom dia!
tela
café
whatsapp
tela tela tela

email
óleo essencial
café
tela e tela

pausa pro almoço
tela
café
whatsapp e tela

ah! água!
boa tarde
tela
relaxante muscular
mais óleo essencial
mais tela

mais café

“tenho que dar um jeito de correr”
tela
“tenho que dar um jeito nessa casa”
álcool 70
“tenho que parar de comer chocolate”
tela e café

e chocolate
boa noite
pra quem?
não tem ninguém
apenas tela

e álcool 70
vinho – na sexta
mingau – nas não-sextas
e tela

13 meses de telas
- 350 mil vidas brasileiras
não existe novo normal
existe um novo mundo
e ele já está girando

cheio de telas

**o mundo não espera ninguém. “e o futuro não é mais como era antigamente”. o que você vai fazer com o privilégio de estar vivo?

domingo, 4 de abril de 2021

"Uma noite em Miami"

Malcom X, Muhammad Ali, Sam Cook e Jim Brown juntos, em um quarto de hotel, no ano de 1964 – auge da luta pelos direitos civis nos EUA.

Essa é a premissa de “Uma noite em Miami”, que marca a estreia da atriz Regina King na direção. O roteiro é adaptado da peça de mesmo nome, já bastante premiada. A linguagem para o cinema é mais dinâmica, mas a gente sente a pegada teatral: boa parte do enredo em um único cenário, poucos personagens, pouquíssima distração. Os diálogos são o centro das atenções.

E olha... diálogos muito profundos. Especialmente para a população preta.

Quatro lendas afro-americanas, reunidas em um quarto de hotel barato, discutindo estratégias de luta contra o rac1sm0, no que era pra ser a comemoração por Muhammad Ali (que, aliás, ainda era Cassius Clay) ter se consagrado campeão dos pesos-pesados. O encontro ocorre logo após a luta vitoriosa, e no dia em que Ali decide anunciar sua conversão ao islamismo.

Apesar de fictício, o filme é baseado em fatos reais. Ali tinha Malcom X como mentor espiritual e amigo. A decisão de se tornar mulçumano foi de fato pensada em conjunto. Sam Cook, famoso cantor de soul, rico, e criticado por não usar sua arte para fortalecer a luta do movimento negro. E Jim Brown, atleta, recordista da NFL na temporada, mas às voltas com a transição de carreira – decide se tornar ator.

No filme, somos apresentados a história e à personalidade dos quatro bem no início, antes do encontro. Logo de cara percebemos como cada um deles lida com o rac1sm0 – e como ele está sempre presente, independentemente de quão bem-sucedido você seja.

A grande reflexão do filme, levantada por Malcom X, é a questão do posicionamento racial. É possível dissociar a luta da fama, em nome do bom trânsito e da boa convivência? Tornar-se famoso é uma forma de libertação? O que emancipa? Dinheiro? Poder?

É sobre isso. Tratado em conversas doloridas, muitas vezes nervosas e ânimos exaltados – afinal, a chaga é profunda.

O filme foi indicado ao Oscar 2021 na categoria de “melhor roteiro adaptado”. Está na Amazon Prime. Depois de assistir, recomendo que você pesquise um pouco sobre a vida de cada um dos quatro. É muito interessante.

sábado, 3 de abril de 2021

A mensagem do sifão

 O ralo da pia da cozinha dava sinais de “problemas” há algum tempo. A água da louça suja começou a descer leeeenta.

“Ai, só falta essa pia entupir!”

Passaram-se os dias, a água foi escorrendo “ok”... vida que segue.

Algumas semanas depois, travou. Dei uns murros no ralo, pra fazer uma pressão. Foi!

Dias depois, de novo.

“Vi na internet que bicabornato com água quente resolve”.

Resolveu!

Mais duas semanas fluindo até que... entupiu de novo!

“Poxa, como se a vida já não estivesse ‘complicada’ o suficiente, agora essa água nojenta parada aqui”.

Minha relação com a pia da cozinha estava dando sinais de “problemas” há alguns meses, mas eu só parei pra resolver hoje, quando o sifão explodiu e interditou tudo.

Ao adiar a solução, eu achava que estava ganhando tempo. Resolvendo outras tretas mais urgentes. Ou, cansada demais pra pensar naquilo.

Enquanto estava dando para lavar a louça, fui tocando.

Mas, ficou insustentável. O sifão não aguentou tanta sujeira. Além de trocá-lo eu tive de limpar o armário alagado e jogar meio saco de açúcar fora.

Isso tudo por volta das 21h, quando eu olhei pra pia cheia da louça do almoço, que eu, deliberadamente, decidi ignorar porque estava cansada demais.

Eu levantei do sofá, olhei pra pia e conclui: ignorar o problema não faz com que ele desapareça. A louça continua ali. Cedo ou tarde vou ter que encará-la.

E assim fiz.

Quando enxaguei o último copo, o sifão pensou: “ótimo, agora olha pra mim aqui, você também não pode mais me ignorar”. E explodiu.

A vida é isso. Você pode encarar de frente e resolver logo os problemas. Ou ir adiando, juntar três semanas de roupa suja, acumular panelas na pia, fingir não ver o pó na estante... e ir tocando.

Mas, nada disso some. Está tudo lá, esperando você unir forças, criar coragem e limpar tudo de uma vez.

O momento? Cada um tem o seu.
Até que não tem mais.
Até que entope, azeda, mofa e você já não é mais livre pra decidir. Ou desiste e joga fora, ou encara o trabalho dobrado pra limpar – com o risco de nem ficar 100%,  uma mancha ali, uma mal cheiro impregnado acolá...

Como vocês perceberam pelo sifão, eu me dei conta disso na marra.

Mas, aprendi a trocar sifão!

Agora, vamos desentupir as tretas da vida.

segunda-feira, 29 de março de 2021

Por do sol

O por de sol de sexta foi um carinho.

Interpretei como um afago de Deus.
“Apegue-se ao que te conforta”.


Foi também na sexta que li a notícia que mais aqueceu meu coração neste ano, até agora: o desenvolvimento da Butanvac!

Uma vacina contra essa moléstia produzida aqui no Brasil, com tecnologia que já existe, é uma prova de que apesar de todo negacionismo, o progresso e a ciência persistem. Seguem. E vão vencer!

E se parece que estamos nadando contra a maré, que a onda é pesada demais... bom, é mesmo! Estamos tomando bons caldos. Eu mesma já sonhei com tsunami três vezes nesta pandemia. Mas, eu sempre consigo chegar à praia. Meio esfolada e atordoada, é verdade. Porém, consciente.

Confie na sua consciência. Ou, para ser mais poética, ouça o seu coração – ele sempre tele leva pra onde você precisa estar, por mais que o caminho pareça sem sentido. 

Neste último ano, a gente vive uma montanha-russa de emoções a cada 24 horas. Nunca estamos prontos. A gente até tenta se organizar, mas o planejamento vai pra lata do lixo a cada alta na taxa de transmissibilidade, mutação de vírus, decreto de lockdown.

Na verdade, sempre foi assim. A gente é que gostava de achar que tínhamos o controle da situação. Nunca tivemos.

O que temos é o agora. E isso já é muito!

Foi por isso que eu fiz questão de fotografar esse por do sol – mesmo com condições precárias de tecnologia. Pra me lembrar que enquanto ele, o Sol, estiver lá, haverá novos dias, novas chances, novas possibilidades.

Mesmo nas noites em que tudo parecer embaçado, dias confusos, tardes corridas, madrugadas insones... o Sol segue nascendo!

Andar com fé, já disse Gil.

E viva a ciência!

quarta-feira, 24 de março de 2021

Epifania das panelas

 

Encerrei o expediente do teletrabalho e fui pro segundo turno – “preciso encarar essa pia, não tem mais pra onde fugir”.

Cinco panelas sujas. Não tinha nem espaço mais para disfarçar.

Ok! Escolhi umas músicas, dei o play e vamos lá!

Cerca de 40 minutos depois “a paz invadiu o meu coração”. Pia limpa, fogão limpo. Vencemos!

Mas, quanto tempo dura uma pia vazia?

Quanto tempo dura uma cozinha “em ordem”?

Foi o que eu pensei ao pegar a panela que nem chegou a ir pro armário –  saiu do escorredor direto pra fogão de novo. Chegou a hora do mingau.

E lá vamos de novo!

Foi aí que que tive a epifania das panelas: a “desordem” faz parte da vida. Enquanto houver vida, haverá panelas sujas. A pia cheia significa que a casa está em movimento.

A vida está em movimento.

A gente precisa aprender a conviver com as coisas fora de ordem – porque elas nunca estarão todas no seu devido lugar. Pelo simples fato de que estamos vivos! Remexendo. Bagunçando.

A gente até para e limpa tudo no dia da faxina – esses momentos são necessários. Jogar fora o que não usa mais; tirar o limo do banheiro; organiza o armário num dia, a caixa de brinquedos no outro e assim vai... Mas, você vai continuar usando as roupas. Sua cria vai misturar todos os brinquedos de novo. Que bom! Estamos vivos!

Então, graças à panela de mingau, eu entendi que o objetivo não pode ser deixar tudo em ordem. Porque nunca estará. O segredo é se organizar na bagunça. Entender que faz parte. Vida é movimento. E é se movimentando que a gente altera realidades.

O acúmulo de entulho é que não pode, porque aí até atrapalha o movimento. Então, suje! Quando precisar, limpe! E sigamos!

terça-feira, 23 de março de 2021

Soul

 

Uma animação da Disney com protagonismo preto. Apenas a notícia da produção de “Soul” gerou muita expectativa.

Eu não estava no grupo das mais animadas. Acompanhei o burburinho, li as críticas sobre a dismorfia do personagem principal - que, apesar de ser preto passava a maior parte do filme sendo “alma”, etc, etc, etc.

Mas, é um desenho preto. Na minha infância ninguém mexia com isso não. Cresci numa sociedade que naturalizava o padrão branco. Não se ver na TV era o normal. Então, a criança dentro de mim gritava – vai lá ver!

Fui. De forma bem aberta. E gostei bastante.
Do enredo, da forma encontrada para tratar a morte e principalmente da mensagem que, pra mim, é central: a vida é uma sequência de pequenos momentos e cada um deles importa muito.

 O fato dos personagens serem pretos é agregador. No meu entender, não há nenhuma discussão direta de raça em “Soul”. É a história de um homem negro - pianista, amante de jazz, professor. E negro. Um cidadão normal. Negro.

É isso que somos. Pessoas negras com conflitos, desejos, incoerências, dúvidas, medos... Ver pessoas negras assim, de forma natural, é MUITO importante. É combater o naturalizado padrão branco.

Ponto pra “Soul”!

Além disso, acho muito interessante o fato da reflexão sobre o “sentido da vida” ser abordada em uma animação. Atinge crianças e adultos de forma diferente, obviamente. Eu fui junto com Joe, o protagonista. Minha ficha caiu praticamente junto com a dele. E a epifania embalada por uma trilha de jazz emocional, tocada no piano... foi deságue. Acabei aos prantos.

E não vou me alongar sobre essas epifanias porque todos os meus textos aqui no Cortisol são, basicamente, sobre elas.

“Soul” concorre a melhor animação e melhor trilha sonora no Oscar 2021. Está disponível no Disney+

segunda-feira, 22 de março de 2021

"A concerto is a conversation"

 Um jovem pianista negro.

Compositor premiado, indicado ao Grammy de melhor arranjo com “Green Book” – que levou a estatueta de melhor filme no Oscar de 2019.

Se você viu “Bridgerton”, ouviu músicas dele – a trilha é ele quem assina.

Kris Bowers “chegou lá”.

O avô dele também. Um senhor de 91 anos que nasceu numa Flórida segregacionista e servil. Fugiu do racismo escancarado e se deparou com o estrutural/velado de Los Angeles. Desenvolveu estratégias para driblar o preconceito de raça e conseguiu comprar uma pequena lavanderia - muito bem-sucedida. Tornou-se proprietário das residências de todo o quarteirão.

“A concerto is a conversation” é um documentário dessa família, protagonizado pelo avô e pelo neto. Uma conversa estimulada pela busca das origens. Como pano de fundo, a carreira musical de Kris.

Ele também é o diretor da produção, que concorre ao Oscar de melhor documentário em curta-metragem este ano. A opção por “montar” os diálogos, não me agrada. A mim, soa artificial. Priorizar a perfeição cinematográfica em detrimento da naturalidade da conversa real não me parece acertado para um documentário.

Mas, o resultado é um arquivo vivo e emocional, com depoimento de sujeitos atuantes, autores da própria narrativa, memória da população negra estadunidense. Viva a história oral!

O documentário faz parte do “The New York Times Op-Docs” e está disponível no Youtube.

sábado, 20 de março de 2021

Uma canção para Latasha

Eu sempre gosto de acompanhar os filmes indicados ao Oscar. Sei e não esqueço que ter essa premiação como “validador” é injusto, já que a Academia segue reproduzindo os preconceitos da sociedade.

Recentemente, após uma avalanche de críticas, notamos um esforço para pelo menos indicar produções fora do padrão do “homem branco ocidental”. E, como há algum tempo tenho optado por ver filmes que me tiram desse eixo, este ano o que me interessa é o protagonismo preto.

Começo pela lista dos documentários – gênero que muito me agrada, por sinal. Concorrendo como melhor doc de curta-metragem:  “Uma canção para Latasha”.

Gosto da dança de ideias do título. É um documentário “sobre”, mas se pretende uma canção “para”. Conseguiu abarcar os dois conceitos.

A melhor amiga e a prima de Latasha apresentam a menina, narrando passagens, contando um pouco da história de vida dessa jovem negra, moradora de Los Angeles na década de 1980.

Os recursos da edição, que mistura personagens reais com atores e ilustrações, fazem os 18 minutos do documentário parecerem mais curtos. Mesmo quem não conhece a história – que foi razão de vários protestos nos EUA na época dos fatos – percebe que o final não é feliz.

Eu acabei com um nó na garganta – de dor e de raiva. Importante não deixar casos com o de Latasha caírem no esquecimento – até porque, eles continuam acontecendo. E é potente ver como tragédias podem se tornar protestos poéticos. Canções-documentários. Documentários-canções.

segunda-feira, 15 de março de 2021

Poesia de segunda

 

Para dias cinzas
Café preto

Para espaços vazios
Música

Ou contemplação do silêncio
O que te preencher mais

Para mente confusa
Noite de sono

Ou conversa fiada
O que te aliviar mais

Para arrependimentos
Desculpas sinceras
Para ressentimentos
Corta o laço e já era

Coração pesado prejudica a lombar
O pensar
O querer
O amar

Alivie-se.
Ajeita a coluna.
Hidrate-se.
Lave as mãos.

E
Respira fundo.

Dias ruins passam
Dias bons também
A vida é passamento

quarta-feira, 10 de março de 2021

Esteja bem!

 

Tem sido dias áridos. E o noticiário é bem tóxico, admitamos. Eu sou jornalista e quando se está imersa nesse mar de informações fica difícil perceber, mas é bem danoso pra saúde mental. De quem apura, de quem escreve, de quem lê.

Não é saudável pra ninguém.


Nesse último ano, o assunto foi basicamente o mesmo.

Casos confirmados.Mortes.Ocupação de leitos.Inflação.Declarações absurdas.
(a falta de) Vacina.Lockdown.Clandestinidade.Cepas.E derivados.

É preciso ter responsabilidade – quem apura, quem escreve e quem lê.

As autoridades governamentais também. Mas, delas, já sabemos o que esperar. Aqui no Brasil, admitamos, vivemos a pandemia no verdadeiro esquema “salve-se quem puder”. E isso já é torturante o suficiente.

A minha defesa é que estejamos bem. Bem para cuidar de nós mesmos e dos nossos. Porque ninguém, absolutamente ninguém, vai fazer isso por nós.

Cobrar sim. Principalmente de quem pode e não faz por negligência. Mas, até para isso precisamos estar bem.

A situação já é assustadora por si só. Alarmismo, desespero, cultura do medo... isso aí só ajuda quem quer atrapalhar.

Esteja bem!

Por aqui, tento falar de coisas que me fazem bem Leia coisas que te façam bem! Ouça coisas que te façam sentir bem!

Precisamos de coragem e fé (no que você quiser). Responsabilidade e álcool em gel. Autocuidado e conforto mental.

Precisamos seguir!

Que essa situação nos leve a refletir sobre os critérios que precisam ser observados na hora de eleger o comandante de uma nação.

Com tudo se aprende.

No mais, beba água. Ajeita a coluna. Vibre na frequência da imunização para todos. E bora!


segunda-feira, 8 de março de 2021

Matripotência

MM completou 2 anos. Os 24 meses mais rápidos e longos da minha vida. Intensos, exaustivos, cheios de aprendizados, testagem de limites e um amor indescritível. 


O dia de nascimento do filho é também o dia do nascimento da mãe. Na cultura iorubá, Ìyá é quem dá a vida - e Ìyá tem tantos aniversários quanto o número de filhos. 


Desde que MM nasceu, todo 01/03 é dia de celebrar a vida dele e a vida da Carol mãe - a Carol Ìyá. E sou, porque ele é. Comemoro, porque ele está e, assim, me faz. 


É preciso celebrar a potência da maternagem -  a matripotência. Essa força do gerar, parir, alimentar e se doar pelos anos seguintes. É uma força motriz - é o que move a humanidade. Já parou pra pensar? 


Quem fala muito bem sobre isso é a socióloga iorubá Oyèrónkẹ́ Oyěwùmí. Tem um artigo dela, "What Gender is Motherhood?" (o professor @uan.flor traduziu e está disponível na internet) que deu sentido a muitas coisas por aqui. Esse olhar pra maternidade que conhecemos, de privações e de limitações, é mais uma forma de nos impedir de conhecer a nossa força. O nosso poder transformaador. Maternagem é potência! 


E qualquer forma de maternagem - trazendo ao mundo filhos ou ideias, conduzindo com afeto a prole ou alguém que você ama e também precisa. 


E não quero aqui romantizar nada - a exaustão é real. Por isso, também sempre gosto de escrever sobre a importância da comunidade nesse processo. Não é um caminho solo - não deve ser. 


Tem mais reflexões sobre isso no artigo que eu escrevi pro livro "Tinha que ser preto", que logo menos será lançado pela @editoraconquista. 


Um projeto que só foi possível por meio da minha maternidade. 


MM é minha melhor revolução!

Obrigada, filho! 🖤

A importância dos rituais

 

Você tem algum ritual?

Sou capaz de apostar que sim. É que a gente não presta muita atenção neles...

Algo que você sempre faz ao acordar; por onde começa a se lavar na hora do banho; a última coisa que faz antes de ir se deitar...

Colocar o feijão em cima do arroz; começar a varrer a casa sempre pelo mesmo cômodo; fazer o sinal da cruz ao passar em frente a uma igreja, vestir branco às sextas-feiras...

Rituais não são necessariamente religiosos. São também, mas nem sempre. E acho que a gente acaba negligenciando um pouco a importância de alguns ritos.

Esta semana andei lendo sobre a importância de rituais – da professora Sobonfu Somé, que já citei aqui. Conclui que atribuir intenção às nossas atitudes, coisa que conseguimos por meios dos rituais conscientes, é uma ótima forma de lidar com muitas das nossas questões.

Exemplo: depois da maternidade, acordar não é mais a mesma coisa. A gente acorda no susto, com o chamado, o choro ou o grito da criança.  Leva um tempo até você se dar ao luxo de “acordar naturalmente”. Por isso, eu sempre levantava no sobressalto. E começar o dia assim... olha, não recomendo.

A forma como a gente acorda é uma sinalização pro universo de como está nossa energia para aquele dia. E eu resolvi que não dava mais para sair da cama correndo – e irritada por estar correndo.

Então, se não for questão de vida ou morte, MM me chama e eu len.ta.men.te vou me levantando, faço um alongamento de alguns segundos (só pra coluna entender que “começou”) e, seguindo orientação da @nai.caule, me abraço. Sim! Me dou um abraço e desejo pra mim o que eu quero para aquele dia.

Parece meio bobo. Pra mim pareceu, no início. Eu me sentia ridícula dando um abraço em mim mesma. Mas, é impressionante como faz diferença! E agora o abraço já é sincero, afetuoso mesmo. Do jeito que a gente abraça um amigo querido, sabe?! Qual a dificuldade em se querer bem?

Há alguns meses esse virou meu ritual matinal. Tem funcionado. Estou criando espaços para outros...

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2021

Quando o Carnaval chegar

 

“E quem me vê apanhando da vida duvida que eu vá revidar
Tou me guardando pra quando o carnaval chegar

 

Esse verso de Chico Buarque acendeu em mim um milhão de reflexões e vontades nessa sexta-feira de Carnaval confinada.

O brasileiro (que gosta de Carnaval) vive uma verdadeira catarse nessa época do ano. Esquece problemas, mágoas, falta de grana, e vai se curar na folia. Na rua, nos blocos, na avenida, em cima do trio, na pipoca, nos camarotes, na corda, no meio do mato acampado... cada um tem sua fuga preferida. Acho que é isso: o Carnaval é uma grande fuga.

A gente joga purpurina pra cima e sai correndo. São quatro dias (às vezes mais) de uma vida paralela. Uma realidade forjada em muita felicidade, em muita substância que facilita essa felicidade, em amizades fáceis, amores fáceis, sorrisos fáceis.

Isso aqui não é uma crítica. Eu faço parte desse grupo. Muitas vezes me peguei meio depressiva no meio do bloquinho, pensando qual era o sentido daquilo tudo ali, mas estava lá! Acho importante esse respiro. E cada um respira como dá.

Mas, este ano, não vai rolar essa fuga. A realidade que se apresenta é dura e não convém fugir dela. Há uma ameaça invisível, mas que matou muita gente e continua aí.

Aquela onda de abraços em desconhecidos, compartilhando a garrafa de catuaba e usando o mesmo banheiro químico quente, úmido e fedido (essa parte é o preço que se paga)... Reaproveitando o confete caído no chão, todo mundo meio sentado/meio caindo na calçada para tirar a selfie, a volta pra casa no metrô lotado ao som de músicas duvidosas...

Para gente é lazer, pra uma galera é forma de garantir a renda do mês, para outra parte é a vida mesmo, um ano todo em função de construir carros alegóricos, escrever samba-enredo, ensaiar a percussão... A estimativa do setor de turismo é de um rombo de R$ 4 bi. Na economia como um todo, o dobro.

Foi o que a realidade nos impôs. E quanto mais tempo demorarmos a aceitar, mais tempo ela vai continuar dando na nossa cara.

Parafraseando Chico, com adaptações, tou me guardado para quando Carnaval de 22 chegar. Se a gente fizer tudo direitinho e, apesar de quem gostar de atrapalhar, a vacina chegar pra todo mundo, o Carnaval de 22 vai ser uma celebração épica!

“Eu tenho tanta alegria, adiada, abafada. Quem dera gritar
Tou me guardando pra quando o carnaval (de 22) chegar

Axé!