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segunda-feira, 18 de novembro de 2013

Diagnóstico: saudades da adolescência

Psicólogos britânicos estão sendo orientados a considerar a adolescência como o período que vai até os 25 anos de idade. Li essa manchete há alguns meses na BBC e achei plausível. Não sei bem o que “adolescência” quer dizer, mas é confortável tê-la como respaldo para justificar algumas atitudes. Talvez por isso eu tenha lamentado estar fora dessa definição, mesmo com a extensão dos limites.

Para a psicologia, mesmo a britânica, eu sou adulta. E também não sei direito o que isso quer dizer. Mais responsabilidades? Com certeza. Mais liberdade? Acho que sim. Mas tem confusões e indefinições que não vão embora com a adolescência. E eu começo a desconfiar que elas vão me acompanhar sempre – com alguma alteração na escala de importância.

Há 10 anos uma espinha tinha o dom de acabar com um fim de semana. As espinhas continuam (se isso for sinal de puberdade, serei uma eterna adolescente), mas a gente aprende que a maquiagem certa pode fazer milagres. 

Com o tempo, a gente também se dá conta que nunca foi TÃO gorda como achava que era, que o Henrique da 7ª A não era o cara mais lindo do mundo e que adolescentes são realmente muito dramáticos.

Mas, e quando, no meio dessa reflexão toda, você ainda se identifica com aquela menina de 16 anos? Ou se depara com arrependimentos e frustrações de 10 anos atrás?

A diferença é que as expectativas mudam. As pessoas mudam. Você muda. Por mais que o cenário seja o mesmo e as situações parecidas.

Isso pode ser assustador.

É uma espécie de epifania. De repente você se dá conta que o tempo passou e toda aquela fantasia idealizada na adolescência continua no imaginário. É nessa hora que triunfa a adolescente que se esconde atrás da sua cara de mulher madura. Ela assume o controle por cinco minutos pra te lembrar tudo que para ela seria, e para você não foi.

A mulher madura jura que superou. E é estranho, porque parece ter superado mesmo. Ela não sofre. Mas a adolescente acha tudo aquilo muito esquisito.  “Não era pra gente estar fazendo planos de como será da próxima vez, na próxima chance?”

Arrependimentos não doem quando se é adolescente porque a gente tem a certeza que vai dar tempo de consertar.

A adolescente acha que tem todo tempo do mundo, todas as oportunidades do mundo, o mundo. Mas a mulher adulta sabe que não é bem assim. O tempo passa, as oportunidades também. E o mundo... ah! O mundo é muito grande, é muita ousadia querer tê-lo inteiro.

A adolescente se frustra com esse realismo frio. Acha estranho não ter aquela excitação, aquela ansiedade que deixava o cotidiano mais colorido, que dava ânimo para ler as páginas chatas do meio do livro, tendo a certeza de que o final seria surpreendentemente positivo.

Mas, a mulher adulta já leu esse livro inteiro. Releu. Leu outros bem parecidos nesses 10 anos. Ela sabe que, as vezes, um livro chato é chato mesmo, inclusive o final. Ela se frustrou várias vezes com finais insossos, tristes, previsíveis. E lembra a adolescente que o “viveram felizes para sempre” é coisa de contos de fadas, aqueles que ela deixou de acreditar quando virou adolescente.

A mulher adulta é chata. Controladora. Não perde uma oportunidade de jogar na cara da adolescente como ela é ingênua. A adolescente é sonhadora, romântica, esperançosa e aprendeu, com a criança, que finais felizes podem existir sim – ainda que sejam necessárias algumas adaptações.

É essa adolescente que está achando muito estranha essa vida cheia de números, compromissos, responsabilidades e com pouco sonho. Aquele mesma sensação de quando sumiram as barbies, os cadernos de colorir e os álbuns de figurinha.

A vida adulta não deixa espaço para tardes livres, com canecas de leite condensado com nescau, ouvindo Nirvana ou vendo filme bobo no sofá. Eram nessas tardes que os sonhos cresciam. Eram nessas tardes que a adolescente vislumbrava o futuro, cheio de emoções e de encontros românticos depois da aula de inglês.

Agora, a caneca de leite condensado é calórica demais, Came as you are não faz mais “aquele” sentido, não dá mais tempo de assistir o filme bobo na TV e ela terminou o curso de inglês.

Então, quando é que a gente sonha na vida adulta?

Não sei se quem fez essa pergunta foi a adolescente, a mulher ou a criança que, dormindo há algum tempo, acordou no meio da conversa e ficou preocupada ao perceber aquele cenário sem lápis de cor.

Ninguém respondeu.

domingo, 24 de março de 2013

Um galo na testa – o retorno pra realidade de Tarantino


Sabe aquele momento em que você olha para o cara, seu coração dispara e você tem certeza que ele será o amor da sua vida naquela noite?

Em cinco minutos você imagina como seriam felizes, como vocês têm química, como vocês combinam e como tudo faz sentido, agora que encontrou sua alma gêmea.

Falta só descobrir o nome dele.

Aí ele olha pra você, tem a mesma sensação, se aproxima e pronto: vocês são um casal apaixonado.

Só que não.

Sim, você encontrou o amor da sua vida de uma noite, mas ele não sabe disso e nunca saberá. A menos que você esteja em um filme de comédia romântica ou em algum conto do Walt Disney – esse ilusionista de criancinhas.

No mundo real, o amor da sua vida até olha pra você. E para as outras 20 mulheres que estão em volta, com um decote dez vezes maior que o seu, um short estilo “Lurdinha no baile funk do Alemão” e um salto daqueles que você jamais arriscaria nem experimentar.

No mundo real, a noite acaba e o amor da sua vida tem o amor da vida dele.

E não é você.

Nem nenhuma daquelas 20 mulheres de decote, short e salto agulha, que você queria que fosse para ter um argumento de “auto-absolvição”. É uma mulher normal. De sapatilha e com um decote menor que o seu.

Enquanto você reflete sobre sua existência, depois de perder o amor da sua vida daquela noite, encostada no balcão do bar, um capacete surge do nada e cai na sua cabeça em uma velocidade luz, fazendo você voltar pra realidade.

Um capacete mesmo. De motociclista. No meio da sua testa.

Sabe aqueles cinco minutos que você levou pra se apaixonar? Você precisa desse mesmo tempo pra discernir se tem alguém brigando na balada ou se, de repente, começou a chover capacete.

Até descobrir que foi apenas um garçom burro e baixinho, numa tentativa desastrada de pegar o capacete que estava em cima do freezer de cerveja.

Enquanto sua cabeça estava no meio da trajetória do capacete, o amor da sua vida se divertia com o amor da vida dele. Aquele, que não é você.

É isso que eu chamo de mundo Tarantino.

No mundo Tarantino, você volta pra casa com um galo na testa, se perguntando quantos pregos pregou na cruz de Cristo e pensando no prato de macarronada que vai bater quando chegar em casa, pra curar a ressaca e a frustração.

Ok. No mundo Tarantino “mesmo” você veria alguma cabeça explodir depois de ser atingida por um tiro de pistola e voltaria pra casa com sangue na roupa.

Ainda bem que vivemos apenas no mundo real.

Um galo na testa já é suficiente.

sábado, 12 de janeiro de 2013

Prédios, degraus e Camões


Tem alguém aí totalmente satisfeito com a vida que leva? É possível isso? Ou estamos todos condenados à inquietude eterna?

É como se a escada nunca tivesse fim. Você sobe, sobe, sobe e o que te motiva é olhar pra cima e ver que lá do alto do prédio a vista deve ser linda. Aí você continua subindo e quando chega, aprecia a vista por um minuto, agradecida pela oportunidade e pensando que todos os degraus valeram a pena.

Até que você olha em volta e percebe um prédio mais alto ainda, de onde a vista deve ser muito mais abrangente, panorâmica. “É pra lá que eu quero ir”.

E começa a subir mais e mais degraus.

Sempre haverá um prédio maior? O nosso prédio nunca será da altura suficiente?

Essa possibilidade me assusta. Porque, pensando assim, passaremos a vida subindo escadas e nunca teremos tempo de sentar no terraço com uma taça de Lambrusco, admirar a vista, sentir a brisa no rosto e recuperar o fôlego da subida. Nesse raciocínio, a gente pára (com acento porque eu me recuso a abandoná-lo e as novas regras ortográficas nem estão valendo ainda) somente quando o coração der um siricutico no milionésimo degrau.

E aí? A subida foi pelo menos divertida? Ou a preocupação em chegar era tão grande que a gente nem observou as obras de arte que enfeitavam os corredores?

Além disso, há algum problema com os prédios normais? Aqueles que não são um arranha-céu, são apenas edifícios. Cumprem sua função, são honestos e limpinhos, no padrão. Não se destacam, é verdade, mas compõem o cenário da cidade.

Ninguém quer tirar fotos em frente à fachada dos prédios normais. Mas, eles continuam ali, sendo úteis pra muita gente. E a vista do terraço também é bonita. Por que não se contentar com ele?

Porque contentamento é quase sinônimo de preguiça. De derrota.

É?

Contentamento descontente, diria Camões.

De onde vem toda essa pressão, Camões? É proibido contentar-se de contente?

Talvez seja o momento de sentar no degrau onde estiver, dar uma olhada em volta e pensar se continuar subindo é uma vontade ou uma imposição. Se o desejo não é, na verdade, descer e brincar no térreo, onde não há nenhum risco de cair – ou onde a queda é menor.

Às vezes é preciso mais coragem pra descer que pra subir, mesmo com a força da gravidade a seu favor.

Agora, se a vontade for subir, tem que ir! Nem que seja pela escada de incêndio. O que não pode é passar a vida esperando o elevador. Eles demoram a chegar e não cabe todo mundo lá dentro. Somente alguns alcançam o topo do edifício sem o esforço dos degraus.