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quinta-feira, 17 de dezembro de 2020

Envolvimento ubuntu

Tem dias que a gente acha que está fazendo tudo errado.

Trabalha tempo de mais, brinca com a cria tempo de menos.

É banho, é fralda, é almoço, é ninar, é banho, é fralda...

É cansaço!

“Será que ele gosta de mim?” – vocês nunca se perguntaram?

Tem dias que a gente se acha incapaz de conciliar tudo.

É trabalho, é supermercado, é texto pra ler, é  faculdade, é supermercado de novo... um trabalho invisível sem fim.

“Será que vou voltar a ter tempo pra mim” – vocês nunca se perguntaram?

Tem dias que a gente só quer que o dia chegue ao fim.

E sempre chega. E nasce outro. Com novas possibilidades.

As obrigações vão ser as mesmas. Talvez apareça uma mão estendida para dar uma força, uma mensagem ao longo dia que te faça dar risada... coisas que tornam a jornada mais leve. Mas, a roupa suja vai continuar lá se você não lavar. E o leite sempre acaba. Tem que ir comprar mais. Não dá pra fugir da realidade.

E tudo bem ficar cansada. É bem cansativo mesmo! E a gente nem pode deitar em posição fetal e chorar até pegar no sono... não dá tempo!

Na correria do dia a dia não tem essa de “acione sua rede de apoio e tire um tempo pra você”. Até isso precisa ser pensado e organizado.

Pensar e organizar são coisas que, no meio da crise, eu não consigo fazer.

Por isso, na onda das resoluções de fim de ano, decidi que para 2021 preciso pensar e me organizar.

Não é justo comigo nem com MM passar por tantas crises de ira, desencadeadas por exaustão.

Decidi que vou sentar e pensar: quem, de fato está disposto a ajudar? Como posso me organizar com elas?

A gente precisa aprender a pedir ajuda.

Por exemplo, avós normalmente ficam muitos felizes em ser avós – é preciso deixá-los ser! Isso vale para tias, madrinhas, amigas do peito irmãs camaradas. Quem quer de fato participar da sua vida e da sua cria? Com todas as responsabilidades que isso envolve?

São essas pessoas que precisam ser envolvidas. É a elas que você precisa pedir ajuda, antes de surtar – de preferência.

E se você está por perto de uma mãe sobrecarregada e realmente tem disposição em ajudar, demonstre! Falar “qualquer coisa pode me ligar” é muito gentil, mas na prática não tem nenhuma aplicabilidade.

Manda um lanche. Umas frutas e verduras frescas. Se vocês estão convivendo nessa pandemia, libera a mãe por duas horas, de forma aleatória mesmo e de surpresa - pra ela nem saber o que fazer com “tanto tempo livre”.

Dê afeto. Sim, para a criança. Mas, a mãe precisa muito também.

Ubuntu é mais que uma hashtag da moda. Ubuntu é rede. É coletivo. É interdependência.

Para 2021 vou sentar, pensar, organizar e manter por perto apenas quem tope o que chamo de "nível ubuntu de envolvimento".

quinta-feira, 10 de dezembro de 2020

É preciso sentir!

 

Enquanto ancestral de quem tá por vir, eu vou

Esse verso do Emicida eu ouço desde o ano passado, quando escutei “Principia” pela primeira vez. Mas, foi ontem que ele ecoou profundamente em mim. Caiu a ficha de que MM me fez uma ancestral em vida. E isso é muito forte!

A ancestralidade não descansa. E a filosofia ubuntu traduz isso: “eu sou, porque nós somos”.

Somos!

Eu carrego comigo a força, a coragem, a resistência de toda a minha ancestralidade. E estou aqui para honrar tudo isso. A vitória não é minha, é nossa. Os problemas não são meus, são nossos.

E isso se reflete para além da vivência espiritual (tão menosprezada em nome do sistema de dominação ocidental). Isso é a vida em comunidade em África. A professora Sobonfu Somé tem um relato belíssimo de como os povos de Burkina Faso vivenciam o ubuntu.

“Todas as mães são mães de todos”.

Não existe problema pessoal, a comunidade se organiza para que todos consigam estar em harmonia. Todos são responsáveis por todos. Entre mães, que é o que mais me interessa aqui, os filhos são de todas.

Todas por uma. Uma por todas.

Já pensou que louco?

O princípio da coletividade é tão vívido que o entendimento é de que quando uma doença chega é para apontar que algo na comunidade não funciona bem.

Oi, coronavírus.

.

Invoco o ubuntu para defender cada vez mais o aquilombamento da mães pretas, e das mães de crianças pretas. Cuidemos de cada uma delas como se fossem nossas – são nossas!

É por isso que doem aqui as mortes de nossas crianças baleadas a esmo numa terra sem lei. Não são apenas doze mães que perderam seus filhos pro genocídio nas favelas do Rio de Janeiro este ano. Todas nós perdemos essas crianças.

Esse sistema, vendido como civilizado, pautado na lógica iluminista da razão como única forma de existência, é o sistema que não vê problema em deixar o filho da empregada sozinho no elevador, para se perder e cair do 9º andar.

Foi essa lógica existencialista do “penso, logo existo” que desqualificou a filosofia kemética do “sinto, logo coexisto”.

Sentir! É preciso sentir!

Um esforço coletivo, de partilha, de cuidado, de interdependência. Faz bem para saúde mental das mães, protege as crianças, constrói uma sociedade. E não seres humanos insulados.

Para nós, mulheres pretas, isso é basilar. Isso é o que de fato somos. Aquilombemo-nos!

terça-feira, 8 de dezembro de 2020

A culpa que inventaram pra mãe

 Na semana passada eu consegui sair pra correr todos os dias. A rede de apoio segurou a onda com MM enquanto eu tentava alinhar os pensamentos (e, de quebra, queimar calorias) correndo. 

Correr é uma das minhas válvulas de escape. E eu estava sem essa atividade desde a descoberta da gestação. Então, voltar a correr foi tipo um reencontro comigo mesma. 


“Olá, Carol de dois anos atrás! Seu condicionamento mudou, hein?! Bom, MUITA coisa mudou! Mas, que bom que você voltou!”

Estou correndo metade do que corria antes de atravessar o portal da maternidade. E já me faz muito bem! Correr é o meu remédio.

Há alguns meses venho observando os ciclos pelos quais eu e meu organismo passamos.

Sim, mulheres! Não somos estáveis, nosso aparelho reprodutor (pra citar um exemplo) funciona em ciclos e é muito importante conhecermos esse caminho. 

A sociedade ocidental, fundamentada no patriarcado, superestimou a estabilidade, nos classificou de histéricas, queimou “bruxas” e, até hoje, desqualifica nossa fala baseada nesses argumentos. O famoso “está naqueles dias”.

Sim, há semanas que estou mais sensível, mais à flor da pele, mais introspectiva – o que é ótimo para exercícios de acolhimento e de empatia. Em outras semanas, estou mais produtiva, mais resiliente, “sangue no olho”... é quando os desafios, por maiores que sejam, só servem pra me animar. Entendi que é uma ótima semana para iniciar projetos, por exemplo.

E há os dias em que o pavio está mais curto, a irritabilidade é mais presente e o exercício necessário é o da paciência. 

Nenhuma dessas fases me define. Todas elas me compõem.

Eu mapeei meu ciclo e o desafio era encontrar algo que me ajudasse no período que considero mais denso, o da irritação.

Achei: a corrida!

Correndo todos os dias, essa fase passou quase despercebida. A endorfina liberada é uma ótima aliada, no meu caso.

Ela só não funciona pra culpa.

Correr me faz muito bem. E é importante estar bem - porque eu mereço e porque, assim consigo ser minha melhor versão, inclusive como mãe. Mas, essa chatíssima culpa fica aqui apontando o dedo na minha cara, me julgando pelos 50 minutos diários que tirei pra mim, sem MM. 

Conclusão: esse modelo ocidental desenhando pra aprisionar as mulheres é de fato muito eficiente. Individualiza as responsabilidades, mata o senso de rede, de coletividade, de interdependência. O oposto do que vemos nas culturas matriarcais de África... 

“É preciso morrer pro Ocidente”. A conclusão é do filósofo Molefi Kete Asante, e ressoa por aqui. Assunto pro próximo post...

sexta-feira, 27 de novembro de 2020

Eu não sei

A dúvida é um estado legítimo.

Eu entendi isso esta semana. E foi reconfortante.

Percebi que forjei em mim uma mulher de certezas.
Não quero.
Vou.
Não aceito.
Adeus.

 Mas, a real é que agora EU NÃO SEI.

Não sei mesmo. Esse é meu status atual.

E a angústia toda no meu coração não era por não saber. Era por não aceitar esse estado legítimo que é a dúvida.

EU NÃO SEI.

Foi uma epifania. Durante o banho. Depois de uma sessão de terapia (façam terapia!).

Que coisa libertadora é poder admitir que eu não sei o que fazer da minha vida neste momento!

E não tão ninguém me pressionando pra tomar uma decisão – só eu mesma. Minha mente carrasca exigindo um padrão que ela embutiu em mim desde sempre. Uma busca por perfeição e respostas certeiras. Pra ser aceita. Pra ser amada. Pra provar que eu tenho valor, numa sociedade que diz a todo tempo que eu não tenho nenhum.

(Um abraço aqui, irmãs pretas!)

Pois bem. Chega!

.

Querida, mente:

Silêncio, por favor! Eu não tenho essa resposta.  Eu não preciso ter essa resposta agora. EU NÃO SEI.

Esses seus argumentos fazem muito sentido nessa sociedade ocidental, patriarcal, pautada na dominação e busca insana por poder. Mas, essa não é a minha essência.

Eu preciso SENTIR. E você, querida mente, não ajuda nisso. Mais uma vez: silêncio, por favor!

O “não saber” é legítimo. Para descobrir, vou dar ouvidos a outra parte de mim. Àquela que sempre destoa de você. Àquela que tentam sufocar porque me liberta. Ao coração. Ao que chamam de intuição. Ao que ressoa, por mais que não faça sentido.

O povo originário, lá de África, em Kemet, já dizia: “pensar é uma ação coronária”.

sábado, 21 de novembro de 2020

Afrontosa

Aos que nos querem mortos.

Aos que nos querem em silêncio e passivos.

Aos que negam nossas dores, nossa trajetória.

Aos que nos tiram voz, oportunidade, equidade.

Vocês não são os primeiros.

Os que vieram antes de mim. E os que vieram antes deles. E os antes desses. Todos eles  enfrentaram gente como vocês.

Alguns adoeceram.

Alguns se mataram. 

Outros tantos foram assassinados por vocês.

Não é fácil. Mas, nós continuamos aqui!

A força, a coragem, a sabedoria, a bravura. Isso tudo nos acompanha. 

Assim como as dores e a raiva, a resistência. Está tudo aqui, no meu corpo. 

No meu DNA. 

E segue com meu filho. E seguirá com os filhos deles. E com os filhos desses.

Nós seguiremos!

Vocês não são capazes de nos deter. 

Essas pedras que vocês atiram machucam, mas não nos impedem de chegar.

E nós chegaremos!

Nós não estamos sós!

Nós somos a origem. A solução.

Nada disso que você forjaram sobre nossa história apaga o que ela realmente é. E ela é de realeza. De protagonismo. De abundância.

É disso que vocês tem medo. Vocês tem medo de nós porque sabem a potência que somos.

E somos muita potentes!

Ao contrário de vocês, não temos medo. 

E somos justos. Vamos reaver tudo que é nosso.

Já começou!

Continuem esperneando. 

Esse discursos de ódio. Essa falas negacionistas. A gente conhece há séculos. 

Isso não são nada perto da nossa história!

Nós continuaremos seguindo. Cada dia mais fortes.

Resistindo pela existência.

Afrontando!


terça-feira, 17 de novembro de 2020

Mãe solo

 Tenho ficado muito incomodada com esses textos sobre parentalidade e maternidade e psicologia positiva e etc, etc, etc...  

 “Como criar seu filho de maneira bela e respeitar sua individualidade como mulher no maternar”. 

Lindo nome para um curso, né?! 

Desde que venha com o seguinte subtítulo: partindo do princípio de uma família branca, estruturada no padrão cristão e heteronormativo. 

A maioria esmagadora do material que eu encontro sobre maternidade parte do princípio de que a mãe tem com que partilhar a reponsabilidade de educar a cria. 

“Se afaste e respire”

“Peça ajuda e vá fazer algo por você”

E assim segue.


Mas, olha que louco: 11,5 milhões de mulheres criam os filhos SOZINHAS no Brasil. (IBGE/2018).

Se afasta e deixa a criança com quem?

Em que momento da jornada tripla dá pra encaixar o “fazer algo por você”?

Sobre isso, falei hoje com a @reflexões_de_uma_mae solo no meu quadro de maternidade do CBN Brasília. A Thais é, sozinha, responsável pelas duas filhas de 11 e 2 anos.

A advogada Liliana Marquez, presidente da Comissão de Família da OAB-DF, também participou da conversa para deixar bem explicadinho tudo que a lei garante a essas mães e a essas crianças. Vou deixar o link do papo na bio.

Mas, tem outra coisa que me incomoda nesses textos, vídeos, cursos e perfis de maternidade: todos partem de incômodos de pessoas brancas.

Em tempo: criar crianças brancas é BEM diferente de criar crianças pretas numa sociedade estruturalmente racista.

Ser uma mulher branca é MUITO diferente de ser uma mulher preta numa sociedade estruturalmente racista.

Quer mais dado? 61% das mães solo brasileiras são negras. (IBGE/2018).

Não dá pra ignorar essa enorme particularidade. Nem para acreditar em coincidência.

Sendo assim, vamos falar muito mais sobre isso por aqui a partir de agora.

quinta-feira, 12 de novembro de 2020

Cansei de brigar

 Passados oito meses da primeira experiência de apresentar um programa de rádio de casa com meu filho de 1 ano nesse “estúdio”, as coisas parecem estar muito mais encaixadas agora.

Bom, oito meses faz muita diferença na vida de um bebê – é quase metade da vida de MM. Mais esperto, mais compreensível... começou a entender a logística da nossa rotina. Fez participações ao vivo? Bom, inevitável! Mas, nada comparado ao início desse confinamento. As primeiras semanas foram ensandecidas.

Mas, a principal mudança foi minha. Parei de me debater nessa areia movediça. Aceitei que esta é a realidade que eu tenho agora – e faço o melhor que posso, dentro do que é possível fazer.

O desespero nascia da não aceitação. Da busca por um ideal que simplesmente é inatingível. Não é possível simular as condições de um estúdio no meu apartamento, com um bebê acordado, ativo, cheio de energia. As condições são essas? O que dá pra fazer?

Fiz. E esse “relaxamento” ajuda meu filho também. Porque uma mãe louca e estressada certamente não consegue agir com calma e paciência – bom, eu não conseguia. Mas, uma mãe que aceita boiar nessa maré e para de brigar com as ondas, se relaciona com mais tranquilidade com a cria. E com todo o resto.

Hoje foi assim no meu estúdio improvisado em casa: um notebook no colo, um microfone na mão e MM do lado. E funcionou.

E não estou aqui romantizando a situação – é cansativo e exige muito. Mas, o desgaste é maior quando parte da energia vai embora na briga com a realidade.

Cansei de briga. De todas elas.

quarta-feira, 4 de novembro de 2020

Estupro é estupro

 

É preciso admitir e partir deste princípio: o estupro está na construção da sociedade brasileira. Mulheres africanas escravizadas, mulheres indígenas, eram constantemente violadas pelos colonizadores. E o fruto dessa violência nos constitui como povo.

Esse levante das mulheres contra a cultura do estupro é muito recente. Muitas ainda nem se deram conta disso. Os homens então... é trabalhoso demais descontruir uma ideia que está enraizada há tantos séculos. Por isso, é sempre bom lembrar: não existe “sexo forçado” ou “sexo não consentido”. Tudo isso é estupro.

O conceito de “sexo”, por si só, prevê uma relação em que as duas – ou seja lá quantas partes forem – estejam de comum acordo.

Outro fato que assusta, mas que é preciso encarar para tentarmos construir uma sociedade mais saudável: os homens – até agora – cresceram naturalizando o estupro. Boa parte deles, (isso inclui seus amigos íntimos, seus parentes, seus  primos...) já transou com mulher desacordada ou bêbada demais para reagir.

Nenhum deles admite ser estuprador. Por isso, quando um caso como o de Mariana Ferrer vem a público (como o dela, e até piores, existem MILHARES por aí, todos os dias), relativizar a conduta do acusado é uma forma de amenizar também a consciência deles.

A tese de que “não se sabia se a vítima tinha ou não condições de oferecer resistência” brota dessa naturalização do estupro.

Você não sabe? Simplesmente NÃO FAÇA!

Isso, como se fosse possível um cara não perceber se a parceira sexual está acordada, ou drogada demais.

Mas, ficou não dúvida? NÃO FAÇA!

Não dá mais para tolerar essa estrutura patriarcal que consente ao homem a propriedade de nossos corpos. O julgamento de Mariana Ferrer demonstra como esses homens continuam unidos para defender essa prática abjeta. Homens brancos. Homens ricos. Homens influentes. Homens privilegiados que são capazes de qualquer coisa – como se viu na conduta do tal advogado – para manter esses privilégios.

Mas, esses “privilégios” agora configuram crime. Gostem ou não, o levante começou. E quem se omite é conivente.

É... até que é bom!

 

Depois de sete meses e 15 dias de teletrabalho, voltei excepcionalmente à redação nesse feriado. A constatação é de que sim, foi difícil, mas estou adaptada à rotina de trabalhar em casa.

Foi uma loucura no início. Super complicado administrar um mini estúdio de rádio dentro de uma casa com um bebê de 1 ano. Muitos surtos, muita culpa... muito “não estou trabalhando direito”, somado a “não estou dando atenção pro meu filho”, junto com “será que passei álcool em tudo ou tem algum corona por aqui?”.

O primeiro mês destruiu, inclusive, meu relacionamento. Bom, não isso apenas, mas isso também. E aí, mais adaptações foram necessárias. Mudamos de endereço, e junto com geladeira, fogão e cama... levamos também o mini estúdio.

Uns ajustes ali, muita rede de apoio aqui... encontramos nossa forma de funcionar. Passado todo o turbilhão, consigo ver como, nessa balança complexa da pandemia, o teletrabalho trouxe coisas positivas. Estar em casa me permite acompanhar de perto o desenvolvimento de MM.

Essa fase é muito gostosa! Eles crescem a olhos vistos! De um dia pro outro o pijama de frio simplesmente não serve mais. Todo dia uma palavra nova, uma gracinha diferente, uma personalidade se mostrando – e por aqui, ai ai, o rapazinho parece já saber ao que veio.

Trabalhar me preenche e me realiza demais. Poder continuar fazendo isso dentro de casa, em segurança, e com meu filho perto é um puta privilégio. Agora, consigo assimilar tudo isso.

Não que eu não queira voltar pra rua, pra redação cheia, pro estúdio que só faz silêncio quando a luz de “ao vivo” acende. Quero demais! Mas, percebo como esses últimos sete meses foram importantes pro meu maternar, como isso fortaleceu a minha conexão com a cria.

Sobre voltar aos estúdios, que sensação estranha uma redação vazia e silenciosa. Que estranho voltar pra baia de trabalho, empoeirada, e rever o calendário – que parou em março. Parece que o tempo parou por ali.

Mas, ninguém passou incólume por essa pandemia. Muito menos o tempo.

sexta-feira, 30 de outubro de 2020

Boiemos!

 

Esses dias rolaram vários reencontros internos por aqui. Foi um passeio por todos os caminhos que eu já percorri até agora. Bom, todos não, os mais recentes.

Reencontrei o meu lado viajante, voltei a todos os lugares, senti de novo todos os cheiros e sabores. Aquele frescor de novidade, que renova a vontade de seguir.

Revisitei também minha vida antes da maternidade – lembrei das baladas, dos sambas, das madrugadas descomprometidas, dos romances, dos fins de romances...

Fui também rever o momento em quem atravessei o portal da maternidade. Desde descobrir a gravidez, toda a gestação, o parto, os meses iniciais... tanta intensidade! Tantas coisas! Muitas só começam a fazer sentido agora.

Tantos diálogos confusos, tantos sentimentos sem nome, tantas incertezas... olhando agora, com esse pequeno distanciamento de  20 meses, parece uma realidade paralela. É como se só agora eu estivesse voltando pro corpo. Antes, eu só me observava. Sem entender nada.

Agora eu entendo. É só olhar nos olhos de MM e entendo tudinho. Todas essas viagens internas, inclusive, ocorrem no momento em que estamos na rotina do sono e eu percebo aquele pequeno mini rapaz adormecendo.

Filho é a materialização do tempo. Você percebe que se piscar, perde momentos. Que ao brigar com a realidade você deixa de vivê-la – e que isso é um desperdício. É preciso sentir cada momento. São eles que nos compõem. Todos eles. Os bons, os ruins, os insonsos, os turbulentos, os pandêmicos...

Lembrei de uma mensagem que eu recebi, num momento de muita angústia e dúvida: A vida é como um rio, é melhor tentar boiar que ficar se debatendo na água. Boia e aproveita o percurso, você vai ver como as águas ficam muito mais tranquilas.

Conselho ancestral, hein?! De África!
Hotep!

terça-feira, 27 de outubro de 2020

A parte boa


Acho a nossa estratégia de sobrevivência muito poética. Para superar a dor, as mágoas, os rancores, a gente se apega sempre à parte boa e bonita da história.

É isso que garante, por exemplo, a perpetuação da espécie. A mãe esquece as dores na coluna e a azia da gestação, os incontáveis meses em privação de sono, as toneladas de fraldas (e os cifrões que isso envolve)... esquece tudo e engravida de novo!

Passa por tudo outra vez porque se apega à parte boa e bonita da história. Às mãozinhas sedentas por descobrir o mundo, aos olhinhos curioso, ao cheirinho de neném, às risadinhas por qualquer gracinha sem graça que a gente faz... Isso tudo também passa, mas disso a gente senta falta. E quer viver de novo.

Não. Eu ainda não estou nessa fase. Mas, semana passada, me peguei chorando, com saudade de amamentar. Sim! A gente não lembra do mamilo rachado, nem do leite empedrado. A gente lembra daquele carinho, do neném adormecendo nos seus braços na mais completa sensação de paz. E dá saudade.

É poético, né?! É a nossa forma de sobreviver.

E isso vale pra tudo.

Eu sei que virei noites concluindo trabalhos da faculdade, que não tinha dinheiro nenhum naquela época, que tinha um medo danado de não me encontrar na profissão. Mas, é muito mais latente na memória as tardes que eu passei jogada no Minhocão da UnB filosofando sobre a vida, as amizades que fiz com mulheres que são meu arrimo até hoje, as festas estranhas com gente esquisita, os churrascos sem carne dos cursos de engenharia... é essa a parte boa que fica!


terça-feira, 29 de setembro de 2020

Conexão natureza

 Depois de 118 dias, choveu em Brasília. Foram dois dias de céu cinza, ventos cortantes, temperaturas baixas, dias escuros – bem no começo da primavera.

Foram dois dias de ansiedade, “não aguento mais essa pandemia!”, melancolia e saudades.

Metade do vidrinho de óleo essencial de bergamota com cedros atlas foi embora em 48 horas.

A gente está muito mais conectada à natureza do que parece.

Depois, volta o sol. Onda de calor. Tempo seco. Difícil respirar. E a energia, solar!

MM despertou às 5:58. O céu estava claro – o sol nasceu cedo.

Antes da 7:00 eu já tinha dado o café da manhã da cria, lavado uma máquina de roupa, limpado a casa (sim, é um apê pequeno, mas não diminua o meu trabalho) E gritado com MM que resolveu que queria colo durante o meu coco matinal. Invadiu o banheiro, com o copo de vitamina na mão e nem aí para o fato de a mãe estar sentada na privada.

Não ria.
Eu chorei.

Às 9:00 eu já estava exausta. E acabou o gás. Nem deu para passar mais café.

Sol a pino lá fora. Temperatura borbulhando aqui dentro.

A gente está muito mais conectada à natureza do que parece.

Meio dia. Ainda falta metade!

A cabeça denuncia: umidade abaixo dos 20% e você não tomou nem um copo d’água. Logo você!

Pois é tanta coisa eu que fazia e não cabe mais no dia. Mesmo começando antes das seis da matina.

Tem dias que são secos demais. Lá fora e aqui dentro.

As culturas africanas reconhecem o parentesco entre a vida humana e a natureza. A premissa é buscar a convivência harmoniosa, em comunhão com ela.

E isso não é possível sem respeito. Aos ciclos, ao tempo, ao semear e ao florir. Respeitar a chuva, os ventos, as marés. Respeitar lá fora e respeitar aqui dentro.

Se é de chuva, deixa chover. Se é de troca, deixa a folha seca cair. Não precisa dominar nem consertar a natureza. Somente apreciar e respeitar. Viver os ciclos.

Lá fora e aqui dentro.

A gente está muito mais conectada à natureza do que parece.

segunda-feira, 21 de setembro de 2020

Abandono

1. ato ou efeito de sair sem intenção de voltar

2. falta de amparou ou de assistência

Essa é a definição linguística de abandono.

Todo mundo conhece. Como sujeito ativo ou passivo. Às vezes, os dois ao mesmo tempo.

Você já foi esquecido na escola? Ninguém apareceu na apresentação do Dias dos Pais? Sua mãe faltou àquela luta importante de graduação de faixa no judô?

A sensação é de abandono. Deixa marcas. Você admita ou não.

O crush desapareceu sem nem responder mensagem? Ficou esperando num encontro às cegas e ninguém apareceu? Seu marido saiu de casa para trabalhar há 16 anos e nunca mais voltou? 

Sim. Acontece.

Ouvi uma história de abandono semana passada. Foi assim mesmo, o cidadão saiu um dia e nunca mais voltou. Nenhuma explicação. Nada. Deixou a esposa, o filho de dois anos e toda a família sem notícias.

Até hoje.

Tem muitas histórias assim. Mais ainda de abandono emocional – quem não tem coragem de partir fisicamente, mas que já não está lá há muito tempo. Não se importa, não apoia.  

A gente constrói vários monstros, aponta, julga, guarda mágoas e rancores ao longo das nossas histórias de abandono. Perde esse tempo e essa energia com o foco no outro. E as feridas lá, sendo ignoradas. 

Mulheres ainda estão mais dispostas a enfrentar essas chagas. Ainda que de forma meio torta, a gente tem liberdade para falar de emoções. Mas, o machismo cala e seca os homens. Eles não podem admitir “fraqueza”.  E aí, seguem a vida fingindo que nunca foram machucados, que não sentem o abandono do pai, que não ligam para os foras que receberam ao longo da vida, que superaram a infância suprimida pela responsabilidade de “virar homem”.

E seguem machucando por aí, normalizando condutas de abandono. Afastando pessoas. Retirando-se de relações por falta de habilidade de lidar com as próprias emoções.

Em algum momento esse ciclo precisa se romper. Como mãe de um menino eu penso muito sobre isso. Que todas as vezes que ele ouve “menino bonito não chora” essa cultura que não permite aos homens admitir sofrimento se fortalece. E isso vai continuar adoecendo as relações.

Somos, homens e mulheres, seres integrais. O emocional nos compõe. Nos amarra ou nos liberta. 

E tem muita gente presa achando que abandonar é liberdade.

segunda-feira, 31 de agosto de 2020

Depois que passa

Eu sempre fui encantada com a relatividade do tempo - essa unidade de medida inventada para forjar o controle da vida. 

Dias, meses, anos... horas, minutos, segundos... o confinamento escancarou os papéis: dominador e submisso. Quem é quem?

Em março tudo entrou em suspenso. Nem os mais pessimistas imaginariam passar quase metade de um ano com restrições até pra respirar. Passou rápido? Ou está passando devagar?

Em março meu filho completou um ano. Parece um borrão, mas eu nunca vivi tanto no espaço de um ano. 

A sensação é de que foram 5 em 1. Acho que meus peitos e meus cabelos concordam comigo.

De março pra cá foram seis meses. E eu não sei dizer qual é a sensação.

Perdas. Muitas perdas. 

Individuais. - De liberdade. De dinheiro. De parceiro. De avós. De sanidade.

E coletivas. - De vidas. Centenas de milhares.

A única certeza é de que não somos os mesmos.

Não significa que melhoramos. Mudamos.

Seis meses. Quanto tempo?

Meu filho aprendeu a andar na pandemia. Confinado.
Organizando minhas coisas para mudança, me dei conta de que há seis meses eu não pegava no carrinho dele. Achei um confete do baile de Carnaval - a última vez que saímos de carrinho, antes do coronavírus.

Um confete de fevereiro. Pareceu do século passado.

Ele não usa mais carrinho. Ele não usa mais banheira. Ele não usa mais bebê conforto. 

Faz 18 meses. E parece que foi ontem que eu estava organizando todas essas coisas esperando ele nascer.

Quanto tempo?

Eu não tenho respostas para nada, apesar de suspeitar de muita coisa. Mas, a conclusão do momento é: não gaste rios de dinheiro com carrinho, banheira, bebê conforto. Nem andador, cadeiras mágicas, slings, etc, etc, etc. Você pisca o olho e tudo isso perde a utilidade. Além de ocupar um espaço danado.

Todas as mães aprendem isso na prática. Mas, uma grande amiga, que foi mãe antes de mim, me salvou. Quase tudo que MM usou foi empréstimo dela. Olívia, 4, e MM, 1, compartilharam carrinho, suporte de banheira, bebê conforto. E tudo está novinho. Pronto pro próximo que chegar.

Consumo consciente. Poupa dinheiro, reduz lixo, libera espaço pro que realmente importa: o tempo.

Sabe aquele clichê,  "aproveita! passa muito rápido"?!

Passa muito rápido.

Depois que passa.








segunda-feira, 24 de agosto de 2020

Entendi, Caetano!

"Respeito muito minhas lágrimas. Mas, ainda mais minha risada"

Concluída mais uma volta em torno do Sol, alguma coisa aqui fez sentido. Graças a lembranças, mensagens e pessoas que apareceram no meio das felicitações.

Aparições virtuais.
Aniversário pandêmico - sem beijo, sem abraço, sem aglomerações.
Mas, com uma epifania. 

Celebrações e festas são ótimas - eu adoro. Mas, no meio delas, talvez o que realmente importa passe batido. Em isolamento, não foi preciso pensar em reserva de restaurante, ou em quantas pessoas cabem na varanda. Nem se seria uma lista de convidados completa, com direito a chefe e namorada do primo, ou um barzinho com os mais íntimos.
Foi preciso apenas viver o dia.

Fazer uma playlist com as músicas preferidas.
Dar o play ao lado de uma lata gelada de ipa.
Receber mensagens protocolares.
Responder as afetuosas.
Autocelebração com um brownie de chocolate.
Esperar de onde nunca veio.
(Oi, frustração! Entra aí, fica à vontade, você já é de casa!)

Viver o dia é olhar pra tudo que passa por ele. Tem dores e vazios também.

E o que falta, falta.
Mas, e o que tem?

Tem quem tirou dois minutos do dia para te escrever um "parabéns". E, naquele momento, a energia dedicada pensando em você, conta. Preenche.

Focar no que falta não deixa a gente ver a quantidade de lugares bonitos que são presenças. E, ao não percebê-los, nos tornamos ausência.

Eu quero ser ausência?

Uma coisa é se proteger e sair de onde não é seguro, de onde nos machucam. Isso é, inclusive, necessário.
Mas, ser ausência por orgulho, por medo, por vingança... faz buraco na gente também
. 

Apesar de parecer, essa nossa jornada não é uma competição sobre quem lacra mais. Os momentos passam. A raiva se dissipa. E ficam as marcas que deixamos nas pessoas, nas vidas que cruzamos.

É muito melhor ser uma memória bonita. A energia liberada por quem lembra com carinho, compensa. Ainda que anos depois.

A epifania? Quero ser lembrança boa! Inclusive pra mim. Quero fazer desses momentos meus comigo mesma uma recordação de aconchego. 

Gentileza e afeto não têm contraindicação. A dosagem é ilimitada. Pode oferecer para todo mundo. Para você principalmente. Quem não quiser, que dispense. E uma recusa não pode cessar a oferta.

"Gotas de leite bom na minha cara. Chuva do mesmo bom sobre os caretas"







quinta-feira, 20 de agosto de 2020

Selfie de vinho

Procurando uma foto, inspirada pelo #tbt, fui passando o rolo da câmera do celular em busca de uma minha. Sozinha. Apenas eu.

Depois de passar por zilhões de imagens, a maioria de MM, achei. Eu e uma taça de vinho há dois meses. Uma selfie que nem me agrada. Mas, está  lá.

De fato. Depois de MM, a taça de vinho tem sido minha principal companhia nos últimos quatro meses. E olha que ela nem é tão assídua assim. Mas, quando aparece, ajuda.

É que os últimos quatro meses foram bem revoltos por aqui. Sim, pandemia e confinamento pesam para todo mundo. E, acredito eu, trouxeram à tona questões que não podem mais esperar para ser resolvidas.

Talvez no campo profissional, ou na vida amorosa. No relacionamento familiar, ou na saúde... tudo que estava sendo adiado e deliberadamente ignorado, emergiu. Não há mais espaço debaixo desse tapete.

Por aqui, a caixa de pandora não deixou pedra sob pedra.

Canos podres estouraram. Malas pesadas arrebentaram. Crianças internas feridas espernearam. 

Sentimentos sufocados sufocaram. O que nunca havia sido dito saiu gritado. Expectativas se frustraram. Vidas terminaram. 

Passado o tornado, o desafio é olhar para todo o estrago, respirar fundo e arrumar cada cantinho da bagunça. 

Sem superestimar a resiliência, achando que a faxina vai ser feita todo de uma vez. 

Sem subestimar a resiliência, achando que não vai se adaptar.

Um cômodo de cada vez, tudo vai se ajeitando. Mas, organiza mesmo!
Não dá mais pra juntar tudo numa caixa, fechar, jogar em cima do guarda-roupa e fingir que não existe.

Cedo ou tarde ela cai na sua cabeça.

Encara cada pedacinho que está fora do lugar. Olha para cada caquinho, se ressinta - se estiver fazendo falta - mas, aceite que quebrou. Não cola mais. Junta tudo e joga fora, se não te serve mais.

Se tem conserto, conserte! Coloque a mão na massa, aperte os parafusos, troque a bateria, faça funcionar! Sem gambiarras. Sem remendos provisórios.

Tudo isso é cansativo. Faça no seu tempo. Tudo bem parar pra respirar. 

Toma uma taça de vinho antes de recomeçar. E tira uma selfie. Daqui há alguns meses ela vai servir pra te lembrar que é preciso celebrar porque, apesar de tudo, restou você.  














segunda-feira, 17 de agosto de 2020

A vida dela

É uma sensação estranha... como se essa vida de agora, não fosse dela. Como se estivesse assistindo os acontecimentos. Expectadora de si mesma.

Encara o espelho em busca de algum vestígio. Alguma coisa conhecida, algum traço que rememore aquela de antes.

Mudou o corpo. Mudou o cabelo. Nem as roupas são as mesmas. Nada é igual.

"Quando foi que eu me perdi?" - pensa com o neném no colo, tentando entender se é possível uma operação resgate.

Ela tem um neném. E toma um susto sempre que lembra disso.

"Um filho. Um pedacinho de mim. Melhorado e fofo!", ri, para disfarçar o medo dessa responsabilidade. E se emociona, porque é bonito pensar que um pedaço dela renasceu.

E é aí que está a beleza mesmo. No renascimento.

A vida antiga não existe mais.

O segredo é parar de procurar por ela. E prestar atenção na outra, que renasceu. Que está crescendo. Aprendendo como se recolocar no mundo. 

Aprendendo.

Sabe a paciência? Essa que se tem com o neném, que está aprendendo a andar, a falar e até a lidar com as emoções? Ela também é necessária para se encontrar, se entender e se reconectar depois de um renascimento.

Você não exige que um bebê de 1 ano saia por aí lendo livros de filosofia ou dando palestras sobre como controlar a raiva. 

Essa cobrança também não é justa com você. 

Então, ela - eu - essas mulheres que tentam se harmonizar - pararam por alguns minutos. Olharam o neném dormindo... 

"Vamos sentar pra conversar? Vamos nos acolher? Vamos nos abraçar?"

Honrar a que nos trouxe até aqui. Agradecer todos partos que possibilitaram renascimento. E pegar no colo essa nova versão de nós, que está chegando agora.

A nova vida é essa. Com esse corpo que foi morada. Com esse cabelo que caiu. E deu espaço pro novo, que está crescendo. E com esse moletom confortável de querentena.

Tem explicação na física quântica pra essa reconexão. Mas, eu nuca fui boa em Exatas - nenhuma versão de mim. Agora, intuitivamente (em intuição eu sou boa!), sei que a gente vai se entender. No fundo, a gente se gosta 

:)



quinta-feira, 13 de agosto de 2020

Ninguém está vindo

No one is coming.

Esse é o título de um dos episódios da minha série do momento, Workin' Moms.  E foi justamente nesse instante sublime de entretenimento, sem nenhuma pretensão de sinapses velozes, que uma grande reflexão surgiu.

Ninguém está vindo.

Ninguém mesmo. 

É você por você.

Uma fatalidade que assusta. 

Mas, que também liberta.

Assusta porque a gente cresceu, especialmente as mulheres, esperando "alguém" chegar. O patriarcado faz a mulher acreditar que o destino dela está condicionado a ser encontrada e assumida por alguém - se der sorte, amada também.

Um belo dia, você se dá conta que esse "alguém" pode até chegar, mas isso não faz a menor diferença. 

Ninguém te salva de si mesmo.

Assusta porque é solitário. Para mães então... Ninguém nunca está vindo. Só o entregador do delivery, porque no nosso eterno "girar de pratos", o do almoço foi o que escolhi deixar cair e quebrar dessa vez. E a entrega normalmente chega e toca o interfone na hora em que a criança dorme.

Essa solidão te acompanha também na madrugada incômoda de dentes nascendo. No estresse do home office mixado com home creche. Na negociação para deixar de ver o bendito vídeo do Homem Aranha - que foi você mesma que apresentou.

Percebe? Ninguém está vindo. 

Você deu o celular na mão da criança pra ela deixar você trabalhar. Ninguém viu. Agora, você também que lute pra ensiná-la que tudo tem limite ((menos a quarentena)).

Tem solidão e tem solitude - palavra da moda que eu entendo como "deleite da solidão". E depois que a gente vira mãe, qualquer cinco minutos sozinha é plena solitude. É hora de comer chocolate sem se esconder. Ninguém está vindo!

Uma taça de vinho na sexta-feira à noite vendo a live do Caetano. Ninguém está vindo!

É libertador!

Você pode ter companhia. Você tem amigos, família, amores. Mãos estendidas que aparecem para ajudar nessa trilha da vida. Mas, nenhum deles pode fazer o que você pode.

E se ninguém pergunta onde dói o calo, pra que se preocupar em explicar porque o sapato está sujo?

É você por você. 

Pra juntar os cacos, quando o prato quebra.
Ou pra celebrar, aquela vitória que só você entende. Pode ser um batom novo, uma noite ininterrupta de sono, um brócolis que passou batido no meio do arroz sem ser rejeitado pela criança, a vacina do corona... 

Ninguém está vindo. Salve-se!

E passa um café forte. Sempre ajuda.




domingo, 19 de julho de 2020

Desmamando a mãe

Depois de 16 meses com privação de sono, com uma pandemia no meio e confinada há 120 dias, dormir uma noite inteira passou a ser um sonho de consumo.

MM sempre mamou em livre demanda. De dia, de tarde, de noite, de madrugada. Nunca dormiu uma noite inteira (pelo menos até agora, vai que hoje é o grande dia?). Aos seis meses, iniciamos a introdução alimentar. Continuou mamando à vontade por mais um mês, até minha licença-maternidade acabar e eu voltar ao trabalho.

De um dia pro outro, o open bar de "mamá" ficou bem regulado. Eu deixava leite para ele tomar na mamadeira uma vez ao longo do dia. Quando a gente se encontrava, por volta das 16h, retomávamos o ciclo.

Até que o coronavírus começou a girar no planeta Terra e chegou o home office. Open bar liberado de novo.

Ele mamava durante o dia e acordava pelo menos uma vez no meio da noite. Não era fome, eu sei. Mas, você já tentou ninar um bebê às 3h da madrugada? Com ele sentindo o cheiro do leite no seu colo? Eu achava BEM mais fácil amamentá-lo e dormir junto com ele.

Deu certo pra gente. Até não dar mais. Até eu me sentir muito exausta e querer dormir em qualquer posição por pelo menos cinco horas seguidas.

Foi então que o famigerado desmame noturno começou a passar pela minha cabeça. Uma rápida pesquisa no Google e você encontra um monte de dicas absurdas, ainda que vendidas como "desmame gentil".

Um monte de receitas mágicas que desconsideram completamente a realidade e uma mãe solo, por exemplo. 

"Não, não tem ninguém para acalmar o bebê quando ele acordar no meio da madrugada. É a mãe com o peito cheio de leite mesmo".

((Aqui vale lembrar que tem muita mãe solo casada.))

E assim, cedi na primeira tentativa. Muito choro e muito sono pra pouca disposição.

Decidi mentalmente mais algumas vezes até que conseguir colocar em prática de fato.

Noite 1: quase três horas de choro ininterrupto. Estresse. Das duas partes. Desespero. Das duas partes.

Quando o dia raiou, com o peito explodindo de leite, a minha maior vontade era amamentar. Mas, eu pensei que liberar de dia e proibir de noite poderia gerar uma confusão na cabeça do MM. "Quando pode e quando não pode?"

E assim, de repente, meu filho tinha mamado pela última vez na noite anterior. E eu nem sabia. 

Estamos nesse processo. E eu estou arrasada. Mais que MM.

Eu gosto de amamentar. Acho lindo vê-lo adormecer. Adoro o carinho que ele também me dá. Adoro a nossa troca. E não estava preparada pra isso.

No primeiro dia eu senti que ele iria me odiar. Pediu algumas vezes, afinal, tínhamos uma rotina... um ritual. Que se quebrou.

Tirei o leite. Ele tomou na mamadeira. E a noite 2 foi mais tranquila: acordou umas 15 vezes, mas aceitava a realidade de dormir sem "mamá".

Na noite 3 ele nem quis o leite da mamadeira. E a produção em mim caiu consideravelmente. 

Eu... bom, eu sigo chorando toda vez que lembro que nossos momentos acabaram. E tento me consolar pensando que vamos construir outros.

Pode soar drama de mãe leonina. Mas, é doído mesmo.

Coisa doida é esse tal de ser mãe.


domingo, 17 de maio de 2020

Continue a nadar


60 dias de isolamento.

Um carrossel de emoções: incerteza, com esperança, com desespero, com exaustão, com álcool 70%, com máscara, com óculos embaçado, com coração despedaçado.

Com escritório dentro de casa, com casa com vazamento, com busca por apartamento, com mudança do lado fora – e uma enorme do lado de dentro.

Em meio a todo o caos, uma pausa forçada.

Uma queda, um corte, muito sangue, pronto socorro. Três pontos na testa.

MM ganhou sua primeira cicatriz. Numa sexta-feira à tarde, no meio de uma brincadeira. 

Quando se trabalha em casa com um bebê de 1 ano é simplesmente IMPOSSÍVEL dar conta de tudo sozinha. Principalmente se o seu escritório precisa simular um estúdio de rádio – não dá pra fazer participações ao vivo na programação com um bebê no colo. Acredite. Eu tentei.

Meus mamilos sangrando foram testemunhas de todas as estratégias que eu experimentei.
Simplesmente não dá. Eu preciso de ajuda.

E, tinha alguém me ajudando enquanto eu trabalhava. Mas, aquele choro desligou qualquer outro som ao redor. O choro, para uma mãe, denuncia: deu ruim!

A cena assusta. Eu não sabia que tinha TANTO sangue na testa. E tão pouco correndo nas minhas veias ao ver meu MM todo ensanguentado.

Mas, ele não precisa de uma mãe desesperada - pensei em meio à vertigem.

Para. Respira. E faz o que tem que ser feito.

Gelo. Colo. Fralda.
Mais gelo. Mais fralda. Mais colo.

O choro cessou. O gelo virou brincadeira. O sangue estancou.
E é como se nada tivesse acontecido.

Quer correr. Quer pular. Quer seguir descobrindo o mundo.

Nova pausa dramática. Primeira ida ao hospital. Anestesia. Choro. Costura a testa. Mais sangue.

Acabou. Um abraço e o mundo volta ao normal (o dele – no meu, as pernas ainda tremem).

MM nem lembra que tem testa. Não se lamenta. Não pensa na cicatriz. Não perde tempo pensando como poderia ter evitado. Não deixa de aproveitar cada minuto para abrir gavetas, correr com a bola na mão, aprender novas palavras, brincar com a Maya.

MM me deu uma grande lição.

Quando é que a gente perde essa capacidade de resiliência? Onde deixamos esse poder de adaptação? Que caminho é esse que nos leva a sempre estar preso ao que poderia ter sido ou ao que será lá na frente, e perder toda a diversão do presente? 

Mesmo com pontos na testa, é possível. Mesmo com o coração aos pedaços, dá pra seguir. Mesmo com máscara e distanciamento social, dá pra ser!

Levanta, seca a lágrima, estanca o sangue, pede um abraço (virtual, por hora) e segue!

Já dizia Dory: continue a nadar!

segunda-feira, 4 de maio de 2020

A última vez

Quantas coisas você fez pela última vez hoje?

Será que dá pra saber?

Há sete meses eu vi minha avó pela última vez. Mas, eu não sabia.

Abracei, beijei, pedi a benção. Pela última vez. Sem ter a menor ideia.

Se eu soubesse, faria diferente? Abraçaria mais demorado? Ficaria mais tempo sentido o cheirinho dela?

Talvez.

Mas, eu não sabia. Apesar de ser uma possibilidade real, a gente nunca admite e faz os cálculos, e toca a vida, sem contar com isso.


***

Mês passado uma frase de Cesare Pavese apareceu para mim duas vezes na mesma semana, num filme e num livro:

::Não nos lembramos de dias, lembramo-nos de momentos::



Sinto-me muito contemplada, Pavese. Entendo perfeitamente o que você quis dizer.

A correria, as obrigações, o lixo acumulado que precisamos levar pra fora, o discurso do presidente que desequilibra mentalmente... toda essa poluição diária faz a gente perder os momentos. 

A gente passa por eles e nem se dá conta que podem ser pela última vez. Que aquele pequeno instante vai ser a lembrança boa, vai fazer a gente fechar os olhos de alegria ao relembrar.

Tem os momentos épicos, que a gente vive e sabe que são épicos. Tipo, um banho de cachoeira depois de uma hora de trilha pesada. Ou, o gole de cerveja quando acaba o jogo e seu time ganha o campeonato.

(saudades dessas duas coisas! que momentos!)

E tem momentos cotidianos que parecem rasos, mas que fazem a gente sorrir sozinho quando lembra. Tipo, seu cachorro filhotinho tentando subir o degrau da garagem e dando cambalhota quando cai por ser pequeninho demais. Ou, o olhar de um bebê que, depois de fazer um esforço enorme, consegue rolar pela primeira vez.


Dura cinco segundos. Mas, fica para sempre.

As 'últimas vezes' acontecem todo dia. A morte torna isso palpável. E, em tempos de pandemia e confinamento, essa ideia ronda a cabeça da gente de forma mais constante. Mas, a última vez não depende dela.

Antes de aprender - ou descobrir que podia - se levantar sozinho, Murilo andava a casa todo arrastando o bumbum no chão. Foi uma semana assim. Até que uma manhã, foi a última vez. Tentou uma, duas, três: levantou! Sem apoio nem ajuda. E nunca mais precisou se arrastar.

(e nunca mais ficou parado no mesmo lugar por mais de dois minutos)

Qual foi a última vez que você brincou de pique-esconde com seus primos?

Um dia a brincadeira acabou, vocês foram tomar um refrigerante e nunca mais brincaram de novo. Foi a última vez. E ninguém sabia.


Qual foi a última vez que você dormiu no colo da sua mãe?
Um dia ele te ninou, te colocou na cama, e dali em diante você passou a adormecer sozinho. Foi a última vez. Ela não sabia. Nem você.

O último beijo de um casal que se separa. Alguém sabia?

A última vez que você se aglomerou, quando foi?

(não vale se você é a Gabriela Pugliesi ou frenquenta manifestação com pauta antidemocrática)

A última vez que você apertou o botão do elevador sem medo do corona?

Ninguém sabia que era a última.

Agora, não dá também pra saber quando vai ser a próxima.

O que nos resta é o que realmente importa: o momento presente.

Os dias difíceis (os fáceis também) caem no esquecimento, viram um amontoado que a gente deleta porque não consegue achar nada nesses arquivos.

Já os momentos bons ficam com a gente. E podem ser usados para dar leveza, se o dia estiver sendo difícil.











quinta-feira, 19 de março de 2020

Home office, lego e fraldas - episódio 1

Eu decidi que faria jornalismo porque queria ser roteirista de HQ. E, nos devaneios juvenis, imaginava que era uma profissão que me permitiria trabalhar de casa. Um computador, uma ideia e pronto! Sem escritório, sem paredes, sem horário fixo.

Bom, o jornalismo venceu a HQ e os fatos exigem que a gente os acompanhe onde eles estiverem. Então, home office nunca rolou.

Até ontem.

Circunstâncias completamente diferentes das lá atrás imaginadas concretizaram o home office.

O coronavírus nos trancou em casa e a rotina deu uma guinada.

Começou com as creches - fechadas. Bebê sem ter com quem ficar.

Surto #1.

Cancelamento de eventos, de shows, de aglomerações. Bibliotecas, museus, academias fechados.

Evitem circular.

Quem puder, fique em casa.

Surto #2.

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Estamos em casa. Eu, o bebê, os legos, as fraldas, o álcool em gel, o wi-fi, os celulares, os grupos de Whatsapp que não param, a checagem de e-mail, a louça crescendo na pia, o "não pode brincar aqui, filho, mamãe tá trabalhando", a roupa de molho no balde, o soro fisiológico, a lista de supermercado, a cama desarrumada, a xícara de café ao lado dos pratos de papinha sujos... o dia que parece não acabar.

No nosso primeiro dia de home office, MM não dormiu. Jornada de 7h30 às 20h30. Com algumas crises no caminho, um incisivo rasgando a gengiva, a curiosidade peculiar, o treino dos passos cambaleantes, o "mamá", a inocência bonita de quem não faz ideia do caos. E a impaciência de quem não faz ideia do caos - e quer tudo AGORA.

Nesse primeiro dia não coloquei a cara na rua. "Isolamento social é isso", tento me consolar. Mas, a memória mais recente é a daquele puerpério inicial - quem viveu, sabe.

Subiu um frio na espinha.

Trabalhar em casa é trabalhar o tempo todo, mesmo quando não está trabalhando, e ter a sensação de que deixou coisas por fazer. Quem tem dupla (tripla) jornada, sabe. Só que, em isolamento a gente nem tira o pijama, nem troca ideia com os colegas, nem pensa mal do cara que pega o elevador pra subir do térreo pra sobreloja. Não tem esse tipo de passatempo.

Desgastante. Ainda mais pela indefinição. O que mais vai fechar? Quanto tempo vai durar?

Junto com a rotina, é preciso rearranjar os hábitos, a mente, a firmeza de espírito.

Teste de coletividade.

Tomara que a gente passe.

E que a pandemia também. Que passe.















sexta-feira, 6 de março de 2020

As vidas em compasso

Esta semana reencontrei uma velha conhecida. Fazia... mais de um ano (quase dois!) que a gente não se via.

A gente saiu, dançou, tomou cerveja, ouviu boa música.... A gente se divertiu!

 Eu estava com saudade dela e nem sabia.

Não vou mentir e dizer que não foi estranho.  Foi um pouco. 

Esses quase dois anos em que estivemos afastadas foram bem transformadores. Eu mudei. Ela... também mudou. Mas, a essência ainda estava lá.

Foi ela que nos reconectou. E também a música - essa danada, poderosa que nos leva a lugares e traz memórias à tona.

Um hit de 2003 que não saia da minha playlist. Sim... 17 anos atrás. Foi pra lá que essa música me levou.

Daí, reencontrei também uma adolescente de 16 anos. Cheia de planos, bastante confusa, com problemas de aceitação e dificuldade de autoamor. Mas, com muita disposição. E muitos sonhos.

A gente lembrou dos medos, de como os vencemos, dos desafios, dos planos da época... e de como a vida se encarregou de fazer tudo diferente.

E de como está tudo bem. 

Choramos juntas: eu, a  adolescente e a companheira de dois anos atrás. 

Somos uma só. 

A  vida vai transformando a gente. Para o bem de todos, a gente amadurece. Mas, cada uma delas ainda está lá. Com a sua devida importância, num espaço-tempo diferente, mas lá. E, quando nos encontramos conscientemente algumas curas acontecem.

O autoamor meio enterrado na adolescente, floresceu na companheira de dois anos atrás. E ela voltou para me lembrar que é assim que a vida faz.... Que o caminho nos ensina e nos fortalece. E que os desafios trazem lições que a gente só vai entender depois. Tem tempo, espaço e lugar para tudo.

Esta semana, durante uma hora e meia, a gente coube, as três, no mesmo lugar, espaço e tempo. Foi importante para entender algumas coisas, relembrar outras e estar desperta para as próximas.

O bonito é que esse reencontro aconteceu após exato um ano da maternidade. A primeira "balada" pós-parto. Balada porque qualquer saída sozinha, mães sabem, vira balada.

Literalmente, uma celebração!

















terça-feira, 3 de março de 2020

Pobre travesseiro

Acordei com dor no pescoço e nos braços. Não daquelas costumeiras, de dias e dias corridos e tensos e cheios de sobrecargas. Era consequência da sequência de socos que eu dei no travesseiro na noite anterior.

Não sei quantos foram. Não contei. Foram os necessários.

Antes do travesseiro eu tentei a parede.

Mas, talvez eu quebrasse o punho.

Era muita raiva.

De quê?

De tanta coisa... De gente. De situações. De não conseguir sair dessas situações...

Virou físico. A raiva era palpável. Eu precisava me livrar dela. Chorar já não adiantava mais.

Aliás, eu sentia raiva até de tanto chorar.

Os socos ajudaram por alguns minutos. Foi cansativo. Os socos e todo o processo que me levou até eles.

De onde vinha?

Como parei nesse lugar?

Levou um tempo - semanas - até eu entender. A raiva era de mim.

De me trair. De me desrespeitar. De me ferir. De não manter o combinado que fiz comigo mesma.

De ignorar a voz que fala quando a mente silencia. 

E por que faço isso?

Por que acumulamos tanto? Por que carregamos tanto? Por que naturalizar essas dores - as nossas, as das nossas mães, avós e acenstrais?

Tem que parar. Em alguém isso tem que parar.

Que seja aqui! 

O processo é dolorido. Pra se livrar do que pesa, machuca e sufoca tem que reconher os pesos, os machucados, o sufocamento. 

Nada disso é confortável.

E muitas vezes nos perdemos nesse redemoinho.

Para, soca o travesseiro e se reacomoda. Olha pra tudo de novo. Sente tudo com honestidade. Acolha-se. E siga.

Um mantra.

Estou na fase do "olhar tudo de novo".

As etapas se interpolam, os caminhos se cruzam e às vezes voltamos pro ponto de partida. O importante é ter o mapa no bolso pra dar uma olhada quando estiver muito perdida.

Qual é o seu mapa?

Recomeçar.

Primeiro por dentro. Depois coloca a bagunça do lado de fora em ordem.

E compra uma luva de boxe.