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segunda-feira, 29 de março de 2021

Por do sol

O por de sol de sexta foi um carinho.

Interpretei como um afago de Deus.
“Apegue-se ao que te conforta”.


Foi também na sexta que li a notícia que mais aqueceu meu coração neste ano, até agora: o desenvolvimento da Butanvac!

Uma vacina contra essa moléstia produzida aqui no Brasil, com tecnologia que já existe, é uma prova de que apesar de todo negacionismo, o progresso e a ciência persistem. Seguem. E vão vencer!

E se parece que estamos nadando contra a maré, que a onda é pesada demais... bom, é mesmo! Estamos tomando bons caldos. Eu mesma já sonhei com tsunami três vezes nesta pandemia. Mas, eu sempre consigo chegar à praia. Meio esfolada e atordoada, é verdade. Porém, consciente.

Confie na sua consciência. Ou, para ser mais poética, ouça o seu coração – ele sempre tele leva pra onde você precisa estar, por mais que o caminho pareça sem sentido. 

Neste último ano, a gente vive uma montanha-russa de emoções a cada 24 horas. Nunca estamos prontos. A gente até tenta se organizar, mas o planejamento vai pra lata do lixo a cada alta na taxa de transmissibilidade, mutação de vírus, decreto de lockdown.

Na verdade, sempre foi assim. A gente é que gostava de achar que tínhamos o controle da situação. Nunca tivemos.

O que temos é o agora. E isso já é muito!

Foi por isso que eu fiz questão de fotografar esse por do sol – mesmo com condições precárias de tecnologia. Pra me lembrar que enquanto ele, o Sol, estiver lá, haverá novos dias, novas chances, novas possibilidades.

Mesmo nas noites em que tudo parecer embaçado, dias confusos, tardes corridas, madrugadas insones... o Sol segue nascendo!

Andar com fé, já disse Gil.

E viva a ciência!

quarta-feira, 24 de março de 2021

Epifania das panelas

 

Encerrei o expediente do teletrabalho e fui pro segundo turno – “preciso encarar essa pia, não tem mais pra onde fugir”.

Cinco panelas sujas. Não tinha nem espaço mais para disfarçar.

Ok! Escolhi umas músicas, dei o play e vamos lá!

Cerca de 40 minutos depois “a paz invadiu o meu coração”. Pia limpa, fogão limpo. Vencemos!

Mas, quanto tempo dura uma pia vazia?

Quanto tempo dura uma cozinha “em ordem”?

Foi o que eu pensei ao pegar a panela que nem chegou a ir pro armário –  saiu do escorredor direto pra fogão de novo. Chegou a hora do mingau.

E lá vamos de novo!

Foi aí que que tive a epifania das panelas: a “desordem” faz parte da vida. Enquanto houver vida, haverá panelas sujas. A pia cheia significa que a casa está em movimento.

A vida está em movimento.

A gente precisa aprender a conviver com as coisas fora de ordem – porque elas nunca estarão todas no seu devido lugar. Pelo simples fato de que estamos vivos! Remexendo. Bagunçando.

A gente até para e limpa tudo no dia da faxina – esses momentos são necessários. Jogar fora o que não usa mais; tirar o limo do banheiro; organiza o armário num dia, a caixa de brinquedos no outro e assim vai... Mas, você vai continuar usando as roupas. Sua cria vai misturar todos os brinquedos de novo. Que bom! Estamos vivos!

Então, graças à panela de mingau, eu entendi que o objetivo não pode ser deixar tudo em ordem. Porque nunca estará. O segredo é se organizar na bagunça. Entender que faz parte. Vida é movimento. E é se movimentando que a gente altera realidades.

O acúmulo de entulho é que não pode, porque aí até atrapalha o movimento. Então, suje! Quando precisar, limpe! E sigamos!

terça-feira, 23 de março de 2021

Soul

 

Uma animação da Disney com protagonismo preto. Apenas a notícia da produção de “Soul” gerou muita expectativa.

Eu não estava no grupo das mais animadas. Acompanhei o burburinho, li as críticas sobre a dismorfia do personagem principal - que, apesar de ser preto passava a maior parte do filme sendo “alma”, etc, etc, etc.

Mas, é um desenho preto. Na minha infância ninguém mexia com isso não. Cresci numa sociedade que naturalizava o padrão branco. Não se ver na TV era o normal. Então, a criança dentro de mim gritava – vai lá ver!

Fui. De forma bem aberta. E gostei bastante.
Do enredo, da forma encontrada para tratar a morte e principalmente da mensagem que, pra mim, é central: a vida é uma sequência de pequenos momentos e cada um deles importa muito.

 O fato dos personagens serem pretos é agregador. No meu entender, não há nenhuma discussão direta de raça em “Soul”. É a história de um homem negro - pianista, amante de jazz, professor. E negro. Um cidadão normal. Negro.

É isso que somos. Pessoas negras com conflitos, desejos, incoerências, dúvidas, medos... Ver pessoas negras assim, de forma natural, é MUITO importante. É combater o naturalizado padrão branco.

Ponto pra “Soul”!

Além disso, acho muito interessante o fato da reflexão sobre o “sentido da vida” ser abordada em uma animação. Atinge crianças e adultos de forma diferente, obviamente. Eu fui junto com Joe, o protagonista. Minha ficha caiu praticamente junto com a dele. E a epifania embalada por uma trilha de jazz emocional, tocada no piano... foi deságue. Acabei aos prantos.

E não vou me alongar sobre essas epifanias porque todos os meus textos aqui no Cortisol são, basicamente, sobre elas.

“Soul” concorre a melhor animação e melhor trilha sonora no Oscar 2021. Está disponível no Disney+

segunda-feira, 22 de março de 2021

"A concerto is a conversation"

 Um jovem pianista negro.

Compositor premiado, indicado ao Grammy de melhor arranjo com “Green Book” – que levou a estatueta de melhor filme no Oscar de 2019.

Se você viu “Bridgerton”, ouviu músicas dele – a trilha é ele quem assina.

Kris Bowers “chegou lá”.

O avô dele também. Um senhor de 91 anos que nasceu numa Flórida segregacionista e servil. Fugiu do racismo escancarado e se deparou com o estrutural/velado de Los Angeles. Desenvolveu estratégias para driblar o preconceito de raça e conseguiu comprar uma pequena lavanderia - muito bem-sucedida. Tornou-se proprietário das residências de todo o quarteirão.

“A concerto is a conversation” é um documentário dessa família, protagonizado pelo avô e pelo neto. Uma conversa estimulada pela busca das origens. Como pano de fundo, a carreira musical de Kris.

Ele também é o diretor da produção, que concorre ao Oscar de melhor documentário em curta-metragem este ano. A opção por “montar” os diálogos, não me agrada. A mim, soa artificial. Priorizar a perfeição cinematográfica em detrimento da naturalidade da conversa real não me parece acertado para um documentário.

Mas, o resultado é um arquivo vivo e emocional, com depoimento de sujeitos atuantes, autores da própria narrativa, memória da população negra estadunidense. Viva a história oral!

O documentário faz parte do “The New York Times Op-Docs” e está disponível no Youtube.

sábado, 20 de março de 2021

Uma canção para Latasha

Eu sempre gosto de acompanhar os filmes indicados ao Oscar. Sei e não esqueço que ter essa premiação como “validador” é injusto, já que a Academia segue reproduzindo os preconceitos da sociedade.

Recentemente, após uma avalanche de críticas, notamos um esforço para pelo menos indicar produções fora do padrão do “homem branco ocidental”. E, como há algum tempo tenho optado por ver filmes que me tiram desse eixo, este ano o que me interessa é o protagonismo preto.

Começo pela lista dos documentários – gênero que muito me agrada, por sinal. Concorrendo como melhor doc de curta-metragem:  “Uma canção para Latasha”.

Gosto da dança de ideias do título. É um documentário “sobre”, mas se pretende uma canção “para”. Conseguiu abarcar os dois conceitos.

A melhor amiga e a prima de Latasha apresentam a menina, narrando passagens, contando um pouco da história de vida dessa jovem negra, moradora de Los Angeles na década de 1980.

Os recursos da edição, que mistura personagens reais com atores e ilustrações, fazem os 18 minutos do documentário parecerem mais curtos. Mesmo quem não conhece a história – que foi razão de vários protestos nos EUA na época dos fatos – percebe que o final não é feliz.

Eu acabei com um nó na garganta – de dor e de raiva. Importante não deixar casos com o de Latasha caírem no esquecimento – até porque, eles continuam acontecendo. E é potente ver como tragédias podem se tornar protestos poéticos. Canções-documentários. Documentários-canções.

segunda-feira, 15 de março de 2021

Poesia de segunda

 

Para dias cinzas
Café preto

Para espaços vazios
Música

Ou contemplação do silêncio
O que te preencher mais

Para mente confusa
Noite de sono

Ou conversa fiada
O que te aliviar mais

Para arrependimentos
Desculpas sinceras
Para ressentimentos
Corta o laço e já era

Coração pesado prejudica a lombar
O pensar
O querer
O amar

Alivie-se.
Ajeita a coluna.
Hidrate-se.
Lave as mãos.

E
Respira fundo.

Dias ruins passam
Dias bons também
A vida é passamento

quarta-feira, 10 de março de 2021

Esteja bem!

 

Tem sido dias áridos. E o noticiário é bem tóxico, admitamos. Eu sou jornalista e quando se está imersa nesse mar de informações fica difícil perceber, mas é bem danoso pra saúde mental. De quem apura, de quem escreve, de quem lê.

Não é saudável pra ninguém.


Nesse último ano, o assunto foi basicamente o mesmo.

Casos confirmados.Mortes.Ocupação de leitos.Inflação.Declarações absurdas.
(a falta de) Vacina.Lockdown.Clandestinidade.Cepas.E derivados.

É preciso ter responsabilidade – quem apura, quem escreve e quem lê.

As autoridades governamentais também. Mas, delas, já sabemos o que esperar. Aqui no Brasil, admitamos, vivemos a pandemia no verdadeiro esquema “salve-se quem puder”. E isso já é torturante o suficiente.

A minha defesa é que estejamos bem. Bem para cuidar de nós mesmos e dos nossos. Porque ninguém, absolutamente ninguém, vai fazer isso por nós.

Cobrar sim. Principalmente de quem pode e não faz por negligência. Mas, até para isso precisamos estar bem.

A situação já é assustadora por si só. Alarmismo, desespero, cultura do medo... isso aí só ajuda quem quer atrapalhar.

Esteja bem!

Por aqui, tento falar de coisas que me fazem bem Leia coisas que te façam bem! Ouça coisas que te façam sentir bem!

Precisamos de coragem e fé (no que você quiser). Responsabilidade e álcool em gel. Autocuidado e conforto mental.

Precisamos seguir!

Que essa situação nos leve a refletir sobre os critérios que precisam ser observados na hora de eleger o comandante de uma nação.

Com tudo se aprende.

No mais, beba água. Ajeita a coluna. Vibre na frequência da imunização para todos. E bora!


segunda-feira, 8 de março de 2021

Matripotência

MM completou 2 anos. Os 24 meses mais rápidos e longos da minha vida. Intensos, exaustivos, cheios de aprendizados, testagem de limites e um amor indescritível. 


O dia de nascimento do filho é também o dia do nascimento da mãe. Na cultura iorubá, Ìyá é quem dá a vida - e Ìyá tem tantos aniversários quanto o número de filhos. 


Desde que MM nasceu, todo 01/03 é dia de celebrar a vida dele e a vida da Carol mãe - a Carol Ìyá. E sou, porque ele é. Comemoro, porque ele está e, assim, me faz. 


É preciso celebrar a potência da maternagem -  a matripotência. Essa força do gerar, parir, alimentar e se doar pelos anos seguintes. É uma força motriz - é o que move a humanidade. Já parou pra pensar? 


Quem fala muito bem sobre isso é a socióloga iorubá Oyèrónkẹ́ Oyěwùmí. Tem um artigo dela, "What Gender is Motherhood?" (o professor @uan.flor traduziu e está disponível na internet) que deu sentido a muitas coisas por aqui. Esse olhar pra maternidade que conhecemos, de privações e de limitações, é mais uma forma de nos impedir de conhecer a nossa força. O nosso poder transformaador. Maternagem é potência! 


E qualquer forma de maternagem - trazendo ao mundo filhos ou ideias, conduzindo com afeto a prole ou alguém que você ama e também precisa. 


E não quero aqui romantizar nada - a exaustão é real. Por isso, também sempre gosto de escrever sobre a importância da comunidade nesse processo. Não é um caminho solo - não deve ser. 


Tem mais reflexões sobre isso no artigo que eu escrevi pro livro "Tinha que ser preto", que logo menos será lançado pela @editoraconquista. 


Um projeto que só foi possível por meio da minha maternidade. 


MM é minha melhor revolução!

Obrigada, filho! 🖤

A importância dos rituais

 

Você tem algum ritual?

Sou capaz de apostar que sim. É que a gente não presta muita atenção neles...

Algo que você sempre faz ao acordar; por onde começa a se lavar na hora do banho; a última coisa que faz antes de ir se deitar...

Colocar o feijão em cima do arroz; começar a varrer a casa sempre pelo mesmo cômodo; fazer o sinal da cruz ao passar em frente a uma igreja, vestir branco às sextas-feiras...

Rituais não são necessariamente religiosos. São também, mas nem sempre. E acho que a gente acaba negligenciando um pouco a importância de alguns ritos.

Esta semana andei lendo sobre a importância de rituais – da professora Sobonfu Somé, que já citei aqui. Conclui que atribuir intenção às nossas atitudes, coisa que conseguimos por meios dos rituais conscientes, é uma ótima forma de lidar com muitas das nossas questões.

Exemplo: depois da maternidade, acordar não é mais a mesma coisa. A gente acorda no susto, com o chamado, o choro ou o grito da criança.  Leva um tempo até você se dar ao luxo de “acordar naturalmente”. Por isso, eu sempre levantava no sobressalto. E começar o dia assim... olha, não recomendo.

A forma como a gente acorda é uma sinalização pro universo de como está nossa energia para aquele dia. E eu resolvi que não dava mais para sair da cama correndo – e irritada por estar correndo.

Então, se não for questão de vida ou morte, MM me chama e eu len.ta.men.te vou me levantando, faço um alongamento de alguns segundos (só pra coluna entender que “começou”) e, seguindo orientação da @nai.caule, me abraço. Sim! Me dou um abraço e desejo pra mim o que eu quero para aquele dia.

Parece meio bobo. Pra mim pareceu, no início. Eu me sentia ridícula dando um abraço em mim mesma. Mas, é impressionante como faz diferença! E agora o abraço já é sincero, afetuoso mesmo. Do jeito que a gente abraça um amigo querido, sabe?! Qual a dificuldade em se querer bem?

Há alguns meses esse virou meu ritual matinal. Tem funcionado. Estou criando espaços para outros...