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sexta-feira, 27 de setembro de 2019

Primeira baixa: a cuidadora

Algumas horas depois de desabafar aqui sobre a dor da separação, a menos de uma semana de voltar pro trabalho, a cuidadora que eu achei ter caído do céu para ficar com MM manda uma mensagem:

"desculpe, não vou continuar. estou me sentindo incapaz"

menos
de
uma
semana
para
voltar
a
trabalhar

Foram dez dias de adaptação. Dias difíceis. 

Passei a reta final da licença tentando fazer meu filho se acostumar com quem, até então, passaria a cuidar dele enquanto eu estivesse fora. Obviamente nada disso faz sentido pra ele.

Não faz nem pra mim, não vou mentir

Ele chorou. Chorou muito. Não aceitava niguém. O primeiro dia de "teste" foi bem traumático.

Bom, fiz errado. Não deveria ter saído assim, logo de cara. Amanhã vou ficar em casa para não ser uma ruptura bruca - pensei eu, tão confusa quanto ingênua.

Duas semanas passando as tardes dentro de casa para ele se acostumar.

Toda a expectativa de voltar a correr, comprar roupas pra trabalhar, e, de repente, quem sabe, num mundo de fantasias, tirar um cochilo enquanto a cuidadora recém-contratada segurasse a onda foi frustrada.

Nenhuma onda foi segurada.

Tem muito de frustração nessa história de maternar. Esperar por ajuda, por exemplo, é uma clássica maneira de quebrar a cara. 

É que a vida de todo mundo segue. E é ótimo brincar com um bebê fofinho por alguns rápidos minutos. Mas, permanecer por uma horinha pra você limpar a casa - veja bem, não é pra bater perna no shopping, é para LIMPAR A CASA - não dá. Todo mundo tem seus afazeres. 

Você que espere o bebê fofinho pegar no sono e vá limpar a casa de madrugada. 

Bom, cada mãe tem seu método. E cada uma tem também um ou dois anjos que aparecem quando mais precisa. Ninguém cria filho sozinho. Não dá. Uma rede de apoio, ainda que mínima, será SEMPRE necessária.

A grande lição anotada até agora é "não crie expectativas porque nada está sob controle".

Nada mesmo.

A gente meio que já ouve isso no decorrer da vida, mas depois de ter um filho essa verdade te dá um cruzado no queixo.

Qualquer coisa pode acontecer. Um coco explosivo depois que você já chamou o uber; uma golfada na camisa que você acabou de vestir pra sair; uma gengiva coçando de madrugada na primeira semana em que ele (aleluia!) dormiu cinco horas seguidas; uma cuidadora que desiste a uma semana do seu retorno ao trabalho.

E vida que segue.

Porque filho também ensina que não dá pra parar. A vida não tem "pause". Um bebê nunca espera. Você pisca, ele rola e cai do carrinho.

Sim. Acontece. Quedas são reais.

E vida que segue.

Não dá muito tempo pra pensar também não. Tem que agir. Reagir.

E vida que segue.



terça-feira, 24 de setembro de 2019

Separação

Contando os nove meses da gestação mais os quase sete meses de vida do meu filho, estamos juntos a um ano e quatro meses. 480 dias de um dormir e acordar quase que devotado a um serzinho que vira nossa prioridade desde que era um amontoado de células em expansão.

Um relacionamento íntimo, simbiótico. Nos leva à exaustão, mas nos apresenta a sentimentos lindos, antes desconhecidos, em intensidade colossal. 

Você está mergulhada nesse novo universo quando, de repente, não mais que de repente, a licença maternidade acaba. Você acorda um dia e tem que deixar seu filho, aquele pedacinho que está grudado em você há 480 dias, com outra pessoa.

Pode ser o pai, a avó, a babá, a tia da creche, a mulher maravilha. Não é você.

Não é você que vai acalentar quando ele chorar.
Não é você que vai fazer ele dormir o soninho da tarde.
Não é pra você que ele vai dar risadinha quando entrar na banheira todo satisfeito.

Pode ser alguém que vai fazer tudo isso melhor que você. Mas, não vai ser você.

É ótimo voltar ao trabalho. Ter que se concentrar em outra coisa, falar com outros adultos sobre temas que não sejam pomada para assadura ou programação do CineMaterna. 

Mas, também é péssimo - eis mais um paradoxo do maternar.

É como se te arrancassem um braço e dissessem: fica tranquila, ele está sendo bem cuidado, pode ir em paz.

É um pedaço de mim. Não dá pra "ir em paz".

Pode ser drama de mãe leonina, pode ser inexperiência de mãe de primeira viagem, pode ser exagero de quem sofre por antecipação. Mas, tá doendo. 

Mais que o parto.

Dá medo de perder momentos importantes. Essas criaturas fazem descobertas a cada minuto - e estar ausente 8 horas todos dos dias é perder descoberta demais.

Dá medo dele se sentir abandonado.

Dá medo da gente não caber mais no trabalho - assim como não cabe na calça que usava pra trabalhar. (assim como não cabe em um monte de outros lugares).

Dá medo de voltar pra casa e ele não te querer mais. (assim como não te querem em um monte de outros lugares).

[Sim, tem restaurante em Brasília que é pet friendly, mas não tem trocador no banheiro].

Falta uma semana para a grande separação.

Enquanto eu me perco entre meditações para manter o eixo e dúvidas sobre quanto de leite deixar congelado, MM dorme sem nem imaginar o que nos aguarda.

Talvez tudo seja surpreendentemente mais simples. Talvez tudo mude para muito melhor.

Talvez eu doe todas as minhas roupas antigas e faça um armário cápsula minimalista.

Talvez eu consiga voltar a malhar.

E eu deveria estar dormindo.

É assim que funciona uma mente prestes a colapsar?

Melhor parar por hoje.