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terça-feira, 26 de janeiro de 2021

A gente precisa de colo

 

Tenho pensado muito sobre “colo”.

Quem não gosta? Quem não quer?

Acho tão bonita a simplicidade das crianças ao pedir. É muito natural. Deu vontade de um dengo, sentiu sono, ficou cansado, para matar a saudade... colo!

MM aqui não tem pudor nenhum. Não tem hora, não tem lugar, não tem nada que o impeça de comunicar a necessidade daquele momento.

“Mamãe, qué tolo”.

Por que a gente perde essa habilidade? O que passa a ser tão constrangedor que nos impede de pedir colo? Não é porque crescemos que deixamos de precisar. Ao contrário, arrisco dizer que é na vida adulta que a gente precisa mesmo.

Colo materno, sim. Mas, também colo amigo, colo apaixonado, colo de amparo, de acolhimento.

E aquele colo trocado, em que você oferta e recebe, aperta e suspira ao mesmo tempo?

Intimidade.

Eu sempre fui uma pessoa de abraços (#vemvacina) e agora me descubro também uma pessoa de colo. Gosto de ser e de ter um. Só não (re)aprendi a pedir.

É que a vida muitas vezes exige que a gente forje uma pessoa que se vira, que faz, que resolve. Bom, a gente até se vira, faz e resolve mesmo. Mas, essa couraça também quer colo.

O coração pede colo – e nesses casos não precisa ser físico. Afago também se faz por meio de palavras, de gestos, de escuta.

Talvez você nem saiba, mas é de colo que você precisa.

Talvez uma carência, muitos colos negados na infância em nome de te fazer forte.

Sendo que é o colo, o afeto, que nos tornam fortes.

Não negue colo, nem pra você mesma. Acolha-se. Dê a você o colo que gostaria de receber. Já tentou?

Acordar de manhã, se desejar um bom dia e se abraçar? Um colo rápido, antes de sair da cama, só pra validar seus sentimentos e necessidades antes de cair na luta. Uma construção de intimidade consigo mesma.

Acho que esse autocuidado pode nos deixar mais confortáveis para pedir um colinho, com a mesma naturalidade das crianças. Pode nos deixar mais dispostas a ser colo para quem precisar – para gente mesma, que estamos precisando.

terça-feira, 19 de janeiro de 2021

Pieces of Woman

 

A minha prioridade por aqui é comentar obras afrocentradas. Não é o caso de “Pieces of Woman”, um filme americano, com produção de Martin Scorsese, assinado por roteirista e diretor húngaros, filmado no Canadá. Mas, uma trama que aborda a perda perinatal e se arrisca no terreno do parto humanizado domiciliar, vale a exceção.

Eu chorei no trailer – e pensei duas vezes antes de adicionar o filme na minha lista. Como o esperado, impossível conter as lágrimas ao longo das duas horas de uma trama que te envolvente profundamente – principalmente se for mãe.

Somos apresentados à Martha e Sean quando o casal está nas semanas finais da gestação – e toda a expectativa que isso gera. Depois, somos testemunhas oculares do parto domiciliar de Martha: quase meia hora de ansiedade, bolsa rompendo, dor, contração, a frustração ao saber que a enfermeira que acompanhou o pré-natal não vai chegar a tempo... a força da mãe que quer parir, o medo e o esforço do pai que quer apoiar. Quem pariu vive um flashback. Quem pariu em casa com certeza vai apontar problemas na cena. E profissionais de saúde que dão assistência a esse tipo de parto também  (aqui recomendo post que a @humanizapartos fez sobre o filme e ajuda a desmistificar o parto domiciliar).

Quando a angústia do parto acaba, breves minutos de pura ocitocina e contemplação – até que a neném para de respirar e a gente também prende a respiração.

Sabe aquele bagunça que vira a vida nos três primeiros meses do seu bebê  A bagunça hormonal, o peito cheio de leite, os 20 dias de sangramento, a desconexão com parceiro (quando há parceiro) Imagina tudo isso sem o bebê. Imagina tudo isso em meio a autopsia, funeral, culpa... o luto perinatal.

Mergulhar nesse universo durante 60 minutos revela um pouco da dimensão do que essas mulheres, essas famílias enfrentam. A insistência por uma reação, a gana de encontrar um culpado pra ver se alivia a dor... muitos casais não resistem – compreensivelmente.

Tem cenas que destroem a gente. E interpretações belíssimas. Terminei o filme aos prantos. Com vontade de abraçar cada mãe que viveuvive essa dor. Com vontade de agarrar MM e não deixar ele sair dos meus braços nunca mais.


sexta-feira, 15 de janeiro de 2021

Sobre maternidade e futebol

Cheguei à conclusão de que mãe é igual técnico de futebol.

Se o time dá problema, joga mal, perde muitos jogos seguidos, a culpa é toda do técnico.

“Manda ele embora!”

Agora, se o time manda bem, joga em harmonia, arrasa na posse de bola e marca muitos pontos no campeonato, ninguém lembra do técnico. O mérito é dos jogadores, da torcida, da altitude, de qualquer um... o último a ser enaltecido é o técnico.

A mesma coisa com as mães.

Na hora de apagar o incêndio, é a primeira ser lembrada.

“Esse menino não tem mãe, não?!”

Agora, se está dando tudo certo é obra do destino, dos bons ventos, herança genética no tio artista ou do cérebro superdotado... a mãe é mero coadjuvante.

Uma gracinha surpreendente, uma palavra bem pronunciada, a criança bem nutrida com raciocínio sagaz...

“Nossa! Onde ele aprende essas coisas?”

Onde será???

Com quem ele dorme e acorda? Quem limpa e alimenta? Quem conta histórias, estimula a curiosidade, responde as perguntas? Quem acolhe, compra livros, passa horas lendo sobre teorias pedagógicas, parentalidade respeitosa e escolhendo material interessante no streaming?

Quem será?

O destino.

Os bons ventos.

A herança genética do parente artista.

Sim, tudo isso compões um ser humano.

Mas, e a mãe?

Ah é! Tem a mãe! Aquela que faz todo o trabalho invisível.

Estamos aqui, galera! Seria gentil algum tipo de reconhecimento - querendo ajudar, a gente aceita também.

Pela atenção obrigada!


quarta-feira, 6 de janeiro de 2021

O choro (da mãe) é livre?

É complicado ser “o mundo” de alguém.

MM já tem quase dois anos, nossa relação simbiótica aos poucos vai se “desafazendo”. Ele já sabe que existe muita vida além da mamãe. Mas, como somos eu e ele na maior parte do tempo, quando o bicho pega, não tem pra onde correr: é a mamãe mesmo.

Uma das coisas que mais me assustava antes de ser mãe era isso. Como eu, com a cabeça cheia de problemas, poderia ser margem para alguém? Eu, lidando com questões internas profundas e doloridas, um dia estaria pronta para ser amparo de um filho?

Fiz essa reflexão algumas vezes quando pensava em maternidade – muito antes da chegada de MM.

Não me tornei uma pessoa “sem problemas” porque virei mãe. E era assim que via a minha mãe quando era criança – uma pessoa super bem resolvida. Sinal de que ela disfarçava bem.

Eu não consigo disfarçar. Tem dias que não dá. Hoje é um dia desses. A carga pesa, o corpo doí, a cabeça dói, você só queria um tempinho para se refazer.

Não dá.

A cria te necessita. Te chama a todo momento. Tanto e tão repetidamente que a dor de cabeça começa a latejar.

E aí? Faz como?

Eu choro. Mais que MM.

Aliás, acredito que ele vai crescer sabendo que a mãe chora pra caramba.

Somos eu e ele. Não dá pra me esconder pra chorar. Nem pra esperar ele dormir, ou sei lá. É desague. É isso ou enfartar – pelo menos o aperto no peito traz essa sensação.

Tem momentos que choramos os dois juntos. Ele de sono, cansaço, gengiva coçando, necessidade de colo... Eu, de sono, cansaço, necessidade de colo (dependendo do dia, a gengiva também incomoda pois que ainda estou em batalha com os sisos).

A conclusão é que a gente cresce, mas, emocionalmente, amadurece muito pouco. Eu mesma, até hoje não sei lidar com essas mesmas sensações que provocam choro em MM. É por isso que eu deixo ele chorar. Porque eu também não sei lidar de outra forma.

Até sei. Mas, cansei de fingir ser forte.

Diziam que a gente tinha que engolir o choro. Que “aquilo” “não era motivo pra choro”.

A gente cresce engolindo dores. Mas, elas vão pra algum lugar. Refletem na nossa forma de se relacionar, de amar, de se permitir ser amada. Uma hora, a comporta estoura.

Deixem o choro ser livre.